segunda-feira, junho 30, 2008

A terra (sempre a terra)


No Cibertúlia foi há já vários dias feita referência à questão indígena em Roraima. Porque o périplo europeu de alguns dos representantes do CIR passa agora pelo nosso país, gostaria de voltar a ela. Situado no extremo norte do Brasil, o Roraima faz fronteira com a Guiana e a Venezuela e é uma das suas unidades federativas mais pobres. Zona de grandes superfícies planálticas de floresta tropical, é habitada por ingaricós, macuxis, uapixanas, taurepangues, entre outros povos, bem como por várias gerações de colonos entretanto fixadas. As disputas territoriais em diferentes estados brasileiros, constantes desde final do séc. XIX, deram origem no final do séc. XX (após a promulgação do Estatuto do Índio, em 1973), ao redonhecimento e demarcação de territórios indígenas. Uma dessas reservas, precisamente em Roraima, chamada Raposa/Serra do Sol, foi demarcada sob a vigência de Fernando Henrique Cardoso, e está há anos no centro da uma polémica que polariza posições a nível nacional e internacional: por um lado encontram-se os apoiantes da causa índia e ambiental, tentando fazer valer a preservação daquele espaço em mãos indígenas, bem como algo do seu modo de vida e da biodiversidade existente; por outro estão os desenvolvimentistas, promotores da mineração, da exploração pecuária e da rizicultura na região. Ora, desde 2005, após a homologação em área contínua (1,7 milhão de hectares) desta reserva por Lula da Silva, tem-se verificado um crescente conflito político e jurídico: sobretudo os fazendeiros locais e algumas altas patentes das forças armadas invocam a urgência, por motivos de segurança nacional e progresso económico, de descontinuar área homologada. Segundo estes, o governo e posse de tal território nessas mesmas mãos indígenas é passe para o saque - via empresas internacionais com 'frentes' em ONG's a actuar no terreno - aos recursos minerais que se continuamente aí têm sido descobertos; os indígenas invocam os seu direitos, tão tardiamente adquiridos. Aguarda-se nova decisão. Nesta luta, como havia já dado a conhecer por cá Joaquim Franco, em 2005, numa reportagem SIC/Expresso, recrudesce de forma muito real a violência contra essas comunidades indígenas (c.20.000 hab.) e seus apoiantes. Junto delas trabalham há décadas diferentes grupos missionários, os quais se associam ao CIR no testemunho do ambiente presentemente vivido na região, bem como à defesa do direito indígena. Um caso a acompanhar.

Uma verdadeira Nova Águia

A Águia, revista fundamental do nosso século XX ressurgiu este ano com o título Nova Águia, fruto do trabalho de várias associações. É semestral, pelo que ainda há outro número este ano (dedicado ao Padre António Vieira). Só há pouco soube do seu blog, coisa séria como a revista. Como dizia um transeunte ao ver o título na edição impressa, «pois é,vamos a ver se este ano a coisa vai lá...»

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domingo, junho 29, 2008

Onde está a saída de emergência?


Os sintomas de uma crise podem avaliar-se de muitas formas, uma delas é o modo pelo qual as famílias administram os seus bens. Com frequência, em épocas mais difíceis, elas tendem a preservar o máximo possível os seus meios de produção, em detrimento dos itens não produtivos, dos quais, muitas vezes, se desfazem para garantir a sua segurança económica. Este fenómeno a aumentar em Portugal, exige urgentemente uma resposta não só através da recuperação e do fortalecimento dos meios de produção mas também pela sua ligação ao desenvolvimento, de modo a reduzir vulnerabilidades que possam fomentar um ciclo vicioso de situações críticas e alarmantes. Haverá uma saída para isto?

por muito que reescrevam a História, os pixeis ardem mal...


a caixa de comentários do post anterior é um bom exemplo do que é uma enciclopédia «anarca». Quanto ao link para uma entrada da dita, o texto mudou mas continua a ser um plágio. Excepto o último parágrafo, que simplesmente não tem sentido (só o teria, aliás, com uma argumentação verdadeiramente enciclopédica...). O pormenor da bibliografia torna tudo mais grosseiro e aquilo do «esboço», depois desta história, lembra-me o blog do L F Menezes...

A foto é sacada de O Jumento e é só para ver se o Bruno volta a escrever....

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quinta-feira, junho 26, 2008

A vénia da virtude ao vício

A wikipedia, essa fonte de informação tão utilizada por universitários, decerto pela sua seriedade intelectual...
Voltarei a Casais Monteiro em breve, na data exacta.

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quarta-feira, junho 25, 2008

Falhas técnicas

O silêncio sobre as fífias de Lehmann no Turquia-Alemanha, depois do que se disse sobre Ricardo, é Portugal no seu melhor. O jogo, mais um de grande nível, só foi perturbado por quebras de emissão e comentário de entendidos da TVI sobre a sobranceria (primeira parte) e o cinismo (segunda parte) da Alemanha, que isto dos lugares comuns é para usar. O som tira-se, pena é os jogos estarem a acabar...

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Da gerontocracia

Um tema, dois textos bem diversos.

terça-feira, junho 24, 2008

Zurros

De O Jumento, que transcreveu do Público, um cientista social, André Freire: « Em 2009, estará em jogo saber se o chamado "bloco central de interesses" pesa mais do que o voto popular. Uma coisa é certa: se as esquerdas à esquerda do PS se reforçarem significativamente, o bloco central ficará muito mais difícil.» Não sei o que é mais notável: se a deprimente facticidade desta ciência social para a qual a democraticidade do partidos é assunto inexistente, se a esperteza saloia que fala do bloco central de interesses para esconder a evidência de esse suposto bloco de interesses constituir 70 a 80 por cento do eleitorado português, incluindo aí a esquerda democrática, sobrando às «esquerdas à esquerda do PS» (mais apropriado seria dizer «à esquerda da democracia»…) uns meros 20% - se as sondagens actuais se confirmarem em 2009, claro…

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Life savers

Continuo a achar que This Must be the Place é a banda sonora ideal de NYC, mas aqui está um concorrente.

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segunda-feira, junho 23, 2008

O país real



A "Liga dos Últimos" é uma das ideias mais geniais da televisão portuguesa dos últimos anos: visitar os clubes em crise e procurar as razões dessa crise. Acompanho a sua emissão há largo tempo na RTP-N e cada vez ouço falar mais deste programa, agora que passou a ser emitido igualmente na RTP1. Muitos espectadores buscam nele histórias repletas de humor e paródia. Eu vejo-o como um dos melhores retratos do país real a que hoje podemos assistir na televisão. Mais do que reportagens especiais ou "presidências abertas", a Liga conta-nos uma realidade antevista nos campos de um futebol quase sociológico, onde a componente desportiva é relativizada (afinal aqueles clubes visitados pelas equipas do programa estão em último nos seus campeonatos!). Os costumes locais, o confronto entre as tradições de sociedades ex-rurais e a modernização da vida urbana ou sub-urbana, as intrigas e as relações humanas que se estabelecem em torno do esférico, são algumas das marcas do programa. Mas melhor do que estas palavras, é ver. Aqueles lugares e gentes também são Portugal. Também merecem ser observados.

História, Estratégia, Cultura


Este verdadeiro clássico, um dos textos fundadores da História, surge agora (creio que pela primeira vez em Português) integrado numa colecção não de História, não de Estudos Clássicos, nem, sequer, numa de Estudos Europeus ou Helenísticos, mas sim na colecção de Clássicos do Pensamento Estratégico das Edições Sílabo.

A História da Guerra do Peloponeso, texto de Tucídides, chegou-nos incompleto, apesar de ainda assim ser uma obra extensa, rica e influente. Esta edição inclui ampla informação adicional, sobretudo militar, mas também sobre o mundo Antigo em geral.

Agora que as Feiras do Livro encerraram e que o Verão chegou, é mais do que uma óptima leitura, é um acontecimento cultural. Se não tem em seu redor o banzé que acompanhou nos últimos anos traduções de clássicos (vários deles muito menos importantes que Tucídides), isso é apenas lógico e em linha com o que costuma suceder com a maioria dos trabalhos de fundo da edição nesta área. Hoje calha à Sílabo, como já sucede com a INCM e mesmo com a Gulbenkian há vários anos. São os critérios do nosso jornalismo cultural.

À custa de ser repetitivo, sobre o assunto já escrevi, aqui.

PS - A propósito de coisas antigas (à escala de blogs), caro Amigo Bruno, não sei se terá visto esta entrevista no DN de hoje...

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sábado, junho 21, 2008

Almanaque do Povo

Os Revisitadores: A bom passo e a valer visita frequente está o blogue Caminhos da Memória, projecto colectivo de Diana Andringa, Irene Pimentel, Joana Lopes, Maria Manuela Cruzeiro, Miguel Cardina, Raimundo Narciso, Rui Bebiano, entre outros mais.

Dinheirinho, e assim: Sempre interessantes e acessíveis (mesmo para não-iniciados), estes blogues de Pedro Lains e Rui C. Branco.

A mulher que nasceu Maria Rita: polemicamente, para lá dos cânones e a propósito de uma figura grada da Bahia, Irmã Dulce, Rafael Galvão reflecte sobre a bondade no mundo contemporâneo.

Coisas que se encontram na web por acaso: The Museum of Online Museums; Expert Village; Reuter's Photographers Blog.

O país das maravilhas

O artigo de VPV no Público de hoje diz tudo sobre a estupidez ideológica contra o futebol (de que o artigo, também hoje, de JPP de novo exemplifica). É sempre bom ver quem está em decadência voltar a brilhar.
Já quem gosta de futebol, como eu, e por nisso nunca gostou nem de Scolari nem de Ricardo, não conseguirá deixar de se sentir mais irritado com as «análises» à derrota do que com a própria derrota. Agora já pensam que afinal Ronaldo a ponta de lança teria sido bom... E que dizer das teorias da conspiração envolvendo o Chelsea e Scolari, os jogadores alemães e a lesão de Ronaldo, os fatais árbitros... Mas o pior é a milésima tentativa de culpar Ricardo por aquilo que tem em comum com todos os guarda redes portugueses (sair mal da baliza) para esconder o óbvio: os golos são falhas dos defesas, os tais supostos melhores defesas do mundo. Tal como Ronaldo era o melhor do mundo a época inteira, a jogar no ManU, mas se tornou «vaidoso» quando veio para a selecção, também a canalhice de bater em quem já está em baixo (como com João Pinto em 2002) está de volta para ilibar quem falhou duas vezes da mesma maneira. E nunca é o keeper a marcar adversários.

É por esta tristeza de comportamento, por esta falta de nível, que não se ganha. Não se merece.

PS Justiça poética: no dia deste post, jogou-se o Holanda-Rússia, o jogo mais emotivo do Euro até agora, e isto num Euro que é o melhor de que me lembro...

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sexta-feira, junho 20, 2008

Alberto de Lacerda

Esta notícia é boa, embora contribua para uma dispersão de espólios que já hoje atrasa um pouco quem lida com o principal destino deles, a Biblioteca Nacional. Mas a digitalização deve ser um bom contributo para simplificar processos. Que tudo corresse assim tão celeremente, seria bom sinal.

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Ainda a raça?

O mais alto representante diplomático português em Bissau, por altura da comemoração do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas terá expulso uma cidadã portuguesa por ela "não ter cumprimentado Sua Excelência" quando chegou à embaixada lusitana em Bissau. Esta eventual atitude atípica de um representante da República Portuguesa pode, se já não o fez, gerar um incidente diplomático que aparenta ganhar uma legitimação na designação recente, por Cavaco Silva, do 10 de Junho como o dia da raça. Parece que há um Palácio com Necessidade(s) de alterar alguma coisa...

quinta-feira, junho 19, 2008

Selecções

As estatísticas eram más. Mas o mais importante é, à partida, trabalhar para bater os melhores. Se não der, tentou-se. E tentou-se até ao fim. Isto é uma lição importante para o país - no que se fizer deve ser esse o objectivo -, desde que não se caia no ciclo maníaco/depressivo a que o Carlos alude no poste anterior. Afinal, uma selecção de um país de 10 milhões fez uma selecção de um país de 80 milhões sofrer até ao fim.

Always look on the bright side of life...

Eu tinha avisado aqui, ainda que com um link já remoto... Quem tem o melhor marcador da Europa e da Champions (em simultâneo, já houve outro assim?) e o põe na ala, quem tem talento e o deixa no banco, quem falha golos como Moutinho e Pepe falharam, bem pode falar do árbitro. Ronaldo já quase me lembra Ibrahimovic, de tão desperdiçado numa selecção que o limita em vez de o aproveitar.
Nova histeria e depressão marcada para daqui a dois anos :-)

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quarta-feira, junho 18, 2008

Regressando

Depois de algum tempo de silêncio, motivado por uma deslocação à margem esquerda do Guadiana e onde, como diriam os "gato fedorento", não disponho de internet, regresso.
Para escrever que os sinais da crise estão demasiado à vista e com uma tendência para piorarem com a aproximação das eleições legislativas. Sócrates encontra-se na pior posição de sempre, interna e externamente. A falta de alternativas é gritante no quadro político actual. Não creio mesmo que Ferreira Leite venha alguma vez a representar alguma opção válida para contrariar a reeleição do primeiro-ministro.
Mas será que a gasolina e o gasóleo que os veraneantes vão gastar se esquece com a água do mar e com o sol tórrido? Como estará esta crise depois do Verão e das férias? Eu arrisco que todo este clima se esbaterá durante alguns meses e, talvez lá para Novembro, se volte a sair à rua. Quando estiver mais fresco e não for tão aborrecido estar horas ao sol a gritar palavras de ordem. Espero bem que me engane.

terça-feira, junho 17, 2008

Planos para alianças, parte 2

Dois anónimos, duas realidades.
O anónimo-tipo dá informação irrelevante (e já pública há muito, por exemplo no C. Corporativa), pretendendo invalidar algo (não nomeado) no post. O quê? Foi o PSD que seguiu animadamente os eventos (no CC também havia um link sobre isso para o site do BE, o anónimo nisso não reparou...), ou apenas fez o número habitual de querer uma coisa (polícia) e o seu contrário (negociações)? O anónimo pretende lançar a confusão, mas está na hora de actualizar os seus métodos, aqui no blog já estamos habituados a estas investidas...
Já a anónima que assina Beatriz faz sobressair um problema meu em posts (e não só), ser demasiado breve em explicações.
Respondendo: o primeiro passo para forjar uma aliança com a massa abstencionista é prosseguir nas políticas difíceis, e polémicas, que geram reacção. Só assim, sem recuos de última hora, o abstencionista-tipo deixará de ter a fácil desculpa de tudo ficar sempre na mesma.
O segundo passo, como já defendi em livro, é não depender unicamente de mensagens padronizadas de agências de comunicação. Associações a Zapatero ou Obama não bastam. É necessário politizar o discurso e, sem abdicar da questão da comeptência na execução de políticas públicas, enfatizar a dimensão ideológica na governação: é diferente ter um mnistro da solidsariedade que quer acabar com o Rendimento Mínimo Garantido porque os pobres são ladrões (Bagão) e ter um ministro que o repõe e ainda reequilibra as contas da Segurança Social (Vieira da Silva); é diferente ter um ministro da Educação que destrói a colocação de professores dando-a a uma empresa falida de um colega de partido (David Justino) e ter uma ministra que normaliza a situação e, pela primeira vez, adopta um modelo de colocações trienais de professores. Etc.etc. Estas são diferenças nas opções políticas, capazes de mobilizar eleitores sem prejuízo de argumentação mais tecnocrática.
Por fim, e relacionado com os dois pontos anteriores: não perder tempo com confusões retóricas do género «somar Esquerda à Esquerda». O que importa é somar apoio à Esquerda, trazer para ela quem até aqui se abstém. haverá transferências de votos, de protesto ou de apoio às políticas actuais, mas o sucesso destas parece cada vez mais depender do desbloqueio da inactividade de muitos mais. O agregador tem de ser a Esquerda democrática. A argumentação ideológica tem essa virtude pedagógica: remove as falácias da Direita (a ideologia morreu) e da Esquerda anti-democrática (reformismo é mera gestão do capitalismo, etc.).

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No?

Muitas coisas se poderão dizer sobre o referendo irlandês (tudo, aliás, com pouco receio de desmentido). Mas duas são particularmente falsas. E convém lembrar uns pormenores alemães finais.

A primeira falsa impressão é que esta é uma vitória da democracia. Esta é uma farsa democrática. Como é que se pode encarar de outra forma - a não ser se se for político profissional com obrigação de prestar vassalagem ao povo soberano? - um processo eleitoral em que os eleitores não cessam de se queixar de não perceber e achar maçador perceber um texto de um Tratado necessariamente complexo e maçador.
Uma farsa democrática ainda maior porque 53% de 45% dos votantes irlandes (população total 4 milhões) votaram não, apontando como uma das razões querer manter o sistema de votação actualmente vigente na UE, que sobretudo no caso da Alemanha (c.80 milhões, boa parte contribuintes líquidos da UE), é um escandalosa distorção do que lhes seria democraticamente devido tendo em conta essa dimensão populacional.

A segunda falsidade é que este «Não» é claramente uma rejeição da UE. Pelo contrário e como de costume, o campo do «Não» foi tudo menos claro. Nomeadamente, boa parte dele jurou a pés juntos não quer sair da UE. No fundo estes «Nãos», nos termos em que foram obtidos - demagógicos, a cavalo na ignorância afoita, envergonhados - são a melhor homenagem que se poderia prestar aos sucessos da UE, apesar dos evidentes defeitos que como todas as criações humanas inevitavelmente tem.

O que interessa tudo isto em Portugal? Desde logo, arriscarmo-nos a perder a incrível publicidade gratuita do Tratado de Lisboa. Mas é aqui que entram os pormenores alemães... É verdade é que a integração europeia é incrivelmente resistente, tendo resistido a muitas mortes anunciadas (para aí ano sim, ano não) nos últimos cinquenta anos. Duvido, no entanto, que a morrer realmente o projecto de reforma do Tratado de Lisboa, a Alemanha continue disposta a pagar a coesão de uma UE cada vez menos coesa. Duvido que continue a estar disposta a aturar 27 países, que, ao contrário de Berlim, se estão frequentemente a marimbar para o interesse comum, para afirmar o seu peso internacional. Duvido que isso seja bom para Portugal.

sábado, junho 14, 2008

Planos para alianças

É curioso ver, como ainda ontem sucedeu no artigo semanal de J. M. Júdice no Público, a confusão dos movimentos políticos de hoje com os do passado. Tal como Fernando Gil e Paulo Tunhas falavam do socialismo distópico da «rua» como se fosse um novo marxismo, de menor valia, Júdice fala do entusiasmo do PCP com aquilo que qualifica de «protofascismo» dos piquetes recentes. Informa, é certo, que esteve fora do país, o que explica que atribua ao PCP e não ao BE o entusiasmo com os bloqueios de estrada, mas este olhar para trás, para o já conhecido, é prejudicial à análise do presente e a planos para o futuro. O mesmo se poderia dizer do que por aí se escuta sobre um eventual novo Bloco Central, sem atender à realidade política distinta.
Vem isto a propósito de posts de Hugo Mendes em dois blogs que identifiquei há pouco aqui. O Hugo Mendes interessa-se pelo futuro, pelos combates políticos a desenvolver e quer pensar estratégias de coligação para os empreender. E as dificuldades que encontra são interessantes a vários títulos.
De início, haveria que pensar, antes de qualquer coligação, na identificação dos problemas que a exigem. Como bom cientista social, o Hugo Mendes tende a aceitar por bom aquele «eterno presente» no qual a Economia faz papel de ciência absoluta. Sem subestimar a Economia, o presente e, claro, a economia, uma política de Esquerda em Portugal que queira pensar o futuro (é a posição do Hugo Mendes, é a minha), ganharia em notar a persistência de velhos problemas e velhas atitudes nas situações do presente. E em reconhecer que a injustiça é o problema fundamental da sociedade portuguesa, não apenas ao nível económico da distribuição de rendimentos, mas ao nível das oportunidades de vida em geral, em questões de costumes, etc., e que o sistema de justiça português é o maior obstáculo ao desenvolvimento do país. (Claro que o sistema de justiça reflecte práticas sociais, mas a actuação sobre estas deve ser indirecta, através dele, e não por imposição de qualquer agente político sobre as populações.) A lentidão, iniquidade, auto-suficiência e irresponsabilidade do sistema de justiça constituem o centro de gravidade das disfunções mais diversas nos diferentes subsectores sociais de Portugal.
Desta análise ou daquela outra que o Hugo Mendes aceita e privilegia, chegamos à conclusão, velha de quatro décadas na ciência social portuguesa, de a integração nas instituições europeias ser o principal agente de transformação da sociedade portuguesa. Isto é: terá de ser ao nível europeu que políticas sociais, no sentido mais amplo do termo, mudem a realidade política. Isto é muitas vezes esquecido ou subestimado, por ser dificilmente concretizável, mas as alternativas são todas piores. E, tal como no diagnóstico dos males de Portugal, também é preciso uma visão política definida para estratégias a nível europeu. Não basta verberar os irlandeses.
Assim, é neste terceiro ponto que podemos falar de coligações: definido o que fazer (prioridade de problemas) e em que sedes fazê-lo (nacional e europeia), quem são os interlocutores possíveis? Quem respeite o Estado de Direito, quem veja na integração europeia como veículo principal para a modernização social (não apenas económica) portuguesa, quem não adopte uma politica conservadora por convicção ou tacticismo sistemático (pois se falamos de políticas de Esquerda…). No caso português isto limitaria o apoio às políticas actuais ao PSD, e mesmo assim só no caso de este recuperar alguma estabilidade, o que não está minimamente garantido. Assim, o Hugo Mendes (em diálogo comigo, na caixa de comentários de um dos seus posts) fala em possíveis aliados nos parceiros sociais e na elite económica. Ou seja: em trabalhadores e patrões. Sucede que os sindicatos são cada vez menos representativos das profissões futuras e inovadoras, além de a maior força, a CGTP, estar às ordens do PCP; e, do oturo lado, as «elites económicas» são por norma muito mais «elites» do que económicas, pensam muito mais em termos de (distinção de) classe do que em função de racionalidade económica a prazo, indiferentes aos óptimos argumentos e explicações que o Hugo Mendes oferece. Mais surdos, só os «radicais» de extrema-esquerda com que o Hugo se mortifica a explicar o que diz, como se a dificuldade deles fosse cognitiva…
Permito-me uma sugestão construtiva, talvez utópica, mas testável: o aliado natural para essa política tem de ser a imensa minoria que se abstém. Se nas próximas eleições as actuais políticas saírem vencedoras de novo, mas sem a maioria absoluta que agora as sustenta, isso será, todos dizem, o fim anunciado destas reformas. Deixo de parte o profetismo, que nem pensa nas possibilidades que a evolução (ainda no início) no PSD forçosamente trará à Direita e, por arrasto, à Esquerda. O que me interessa é notar que a maior legitimação que esta modernização pode ter reside na sua recondução com diminuição da abstenção, trazendo para a política, para a vida pública, aqueles que anteriormente se abstinham. Há aliados fora das «caixas» já feitas, é a esses que se deve persuadir a caminhar para a Esquerda.

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sexta-feira, junho 13, 2008

Yes or No?

Enquanto a malta espera a confirmação oficial do mais que provável, ocorre a pergunta lateral: vinte quatro horas para apurar os resultados de menos de três milhões de votantes registados? Fosga-se.

[Imagem]

Alfama destronada

As marchas populares, sempre aliadas à história e à tradição, são um evento singular que diferencia Lisboa das restantes cidades do mundo, por constituir uma manifestação popular de cariz cultural, no domínio da música, da poesia e da representação cénica. Nesta manifestação na noite de Santo António, o grande vencedor foi o bairro de Marvila.

quinta-feira, junho 12, 2008

Yes, we Ca(i)n?

Barack Obama conseguiu convencer os 2018 delegados necessários para garantir a nomeação democrata e tornou-se o primeiro afro-americano a encabeçar uma candidatura presidencial. A adesão dos que lhe prometeram o voto permitiu a Barack Obama anunciar a vitória e obrigou Hillary Clinton a reconhecer a derrota formal. No entanto, não me parece que a senadora de Nova Iorque saisse fragilizada deste processo. No partido, houve quem criticasse a sua teimosia em permanecer na corrida mas também são agora muitos aqueles que elogiam a sua tenacidade e admiram o seu espírito combativo. Por esta razão, Obama também se torna num vencedor mais meritório, mas será capaz de vencer John McCain? As atenções centram-se agora neste duelo. É que enquanto Obama usufruiu da prestação dada por Hilary Clinton, John McCain herda o desempenho...de Bush. Será este factor preponderante nas aspirações dos candidatos?

quarta-feira, junho 11, 2008

Fumo e fogo

O fumo: isto é verdade . Mesmo sem nomear quem está no Governo, e mesmo simulando que é problema apenas em Portugal, o problema é real.
O fogo: coisa real é ainda mais a relevância do discurso de 10 de Junho do PR: o apoio a políticas específicas (Defesa, Negócios Estrangeiros), e, em particular, o apelo à responsabilidade («exigência e rigor») de todos e cada um abrem portas ao Governo. E a alguma oposição, o que também é bom. Bem se percebe que alguma Imprensa não se interesse, e que PCP e BE desconversem sobre actos falhados…

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Livros para o Povo: Desigualdade

Há muito que me apetecia saudar o empenho do Henrique Raposo em ir publicando sobre livros no Atlântico. Tentarei ir correspondendo, certamente em ritmo mais lento, mas em duplicado.

Aqui fica um pequeno contributo para uma questão da actualidade. Anthony Giddens, o mentor de Blair, é responsável por este The New Egalitarianism que resultou de uma série de seminário na Policy Network.

Parece que há gente de esquerda em Portugal tão preocupada com a desigualdade que até organiza festas para resolver a questão. É um problema muito complicado, e lamento mas não creio que só com comícios e festas (embora estas aliviem qualquer coisa) se vá lá.

Apesar de tudo há que não cair no pessimismo. Apesar de tudo parece que (afinal, e lendo com atenção!) mesmo a complexa desigualdade relativa está a decrescer em Portugal. É uma flagrante evidência que em termos de pobreza absoluta - apesar de tudo a questão mais importante - Portugal está incomparavelmente melhor do que há trinta anos atrás.

A Terceira Via, de Blair e Companhia, tem-se empenhado imenso nesta questão ao nível da análise e formulação de políticas: avançando novas propostas, corrigindo práticas. Fico a aguardar semelhantes contribuições da extrema-esquerda nacional e respectivos compagnons. Embora, para ser justo, haja que notar a falta reflexão de fundo sobre políticas públicas em todos os partidos portugueses.

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terça-feira, junho 10, 2008

A liberdade é uma topologia da solidão?

Uma óbvia falta a redimir nos links aqui do blog é o Anarca Constipado. Por lá cheguei a esta triste nova, bem preocupante. Liberalismo não é desregulamentação. Pena é que isto venha da UE, pois uma das poucas coisas aproveitáveis da recente entrevista de Alegre na RTP tinha sido relembrar que é a esse nível que muita política social tem de ser pensada e executada. Mesmo sem nada adiantar, Alegre não deixava de ser lógico. Mas com notícias destas, que é isso de trabalho, política social, saúde e consumo?

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segunda-feira, junho 09, 2008

Almanaque do Povo

Mi casa es su casa: A recente vaga de posts por autores convidados, primeiro no 31 da Armada, agora no Corta-Fitas, tem sido uma boa maneira de descobrir ou revisitar a lusoblogosfera [disclaimer: sim, fui uma das postadoras-contribuintes ].

Da fala e da escrita: Burgueses e Burgessos (Auto-Retrato); Kodama/Pilar (Teatro Anatómico); A Ortografia é Estúpida (O Mundo Perfeito); S/Título (F, World); No Divã com Leonardo (Linha dos Nodos).

Recomenda-se: uma visita ao projecto Biffures.

[Almanaque Spirou: daqui]

domingo, junho 08, 2008

Diálogo a seguir

Com tanta animação em torno do diálogo das Esquerdas, que sempre existiu (no parlamento e não só), é oportuno dar notícia deste blog, no qual a Esquerda socialista democrática (à qual por vezes critico amigavelmente uma despolitização que é mais do que mera tecnocracia) discute com a Esquerda que pensa a politica segundo uma filosofia social da inveja. Vale mais do que tudo o que se vai dizendo nos media e reproduzindo nos blogs sobre encenações teatrais recentes.

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sábado, junho 07, 2008

A seguir, sem abandonar

Graças à pista do António Manuel Venda (Floresta do Sul, já linkado aqui ao lado), uma revista a seguir (espero que por muito tempo). Cláudia, linkas?

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quinta-feira, junho 05, 2008

Aprender com os outros

é uma boa ideia. Eu pelo menos acho que sim (a originalidade é por vezes sobrevalorizada). Como o Jorge e o David, a questão da crise alimentar também me tem apoquentado, e não me lembro de ouvir tanta gente queixar-se desde 1983-1984 (eu sei, rapazes, vós éreis mui pequenitos para vos lembrardes...eu não me posso lembrar de outras anteriores, também). Nesse sentido, eu desafiaria as direcções de informação da RTP, SIC e TVI a, num intervalinho do enchimento-de-chouriço futebolístico à borda do lago Neuchâtel (que lá original tem sido, concedo, com directos de padarias turcas e perfis de chiuauas que dão patapés em bolas de cautchu), emularem esta iniciativa da BBC. Do que se lembrou a estação? De uma coisa que qualquer meio de comunicação com correspondentes internacionais pode fazer: acompanhar durante os próximos tempos a vida de várias famílias em outros tantos pontos do globo, de forma a perceber que alimentos vão faltando onde, quem acha que soluções para que problemas, qual a percentagem do orçamento consumida, ou qual a diferença relativa nos preços disto e daquilo. A mim interessa-se o que se passa com as famílias de Porto Alegre, Benguela, Quelimane, Praia, Baucau, Aveiro, que em diferentes tons de português, ou noutras línguas, vão contando as suas notas e moedas, e de certeza que não estou sozinha. Pensem nisso com carinho, têvês.

[Capa: BD da SERASA]

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quarta-feira, junho 04, 2008

O despertar para a crise alimentar?

A crise actual da escassez de alimentos não parece ser redutível a uma só causa, seja ela a pressão de hábitos alimentares, o aumento do custo dos combustíveis, das matérias-primas ou a mera especulação. Seja qual for a combinação dos elementos que a originaram, uma coisa parece ser certa: uma intervenção na área alimentar é inseparável de um projecto de desenvolvimento sustentável para o conjunto da civilização. Jaime Silva parece ter finalmente focada a sua atenção neste problema de sustentabilidade humana e visa a promoção de medidas imediatas através da cooperação internacional. Falta só saber as suas orientações estratégicas...

terça-feira, junho 03, 2008

Sidney Pollack (1934-2008)

Se mais não houvesse, bastaria a produção cinematográfica África Minha para transformar Sidney Pollack num clássico do cinema americano. O realizador, falecido aos 73 anos, admitia filmar com paixão, defendendo valores éticos e políticos tendencialmente de esquerda. Quando o cancro o surpreendeu, preparava um documentário sobre a obra de Frank Gehry. Para a história ficam vários filmes inesquecíveis e várias intervenções como actor.

segunda-feira, junho 02, 2008

Como é possível?

Alguém me explica como é possível a quantidade de bilhetes vendidos e a assistência do Rock in Rio, num país que atravessa uma fase tão difícil da sua economia e do seu poder de compra?