sexta-feira, abril 11, 2008

A esquerda e o casamento

O valor fundamental da esquerda é a igualdade. O casamento é uma instituição igualitária. Logo, a esquerda devia defender o casamento.

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Ainda o «divórcio sem culpa»

O meu post sobre o projecto de «divórcio sem culpa» deu origem a comentários desenvolvidos que me atribuíram um tom que não é o meu. CLeone, no início do seu primeiro comentário, afirma que a «questão da culpa não é metafísica». Ora, se no meu post recorro à palavra «metafísica» é com ironia, sublinhando a carga religiosa que continua a ter a palavra «culpa» neste contexto. E também a conotação anti-religiosa de algumas intervenções a favor da eliminação da «culpa» do casamento. Estas conotações dão bastante dramatismo à discussão, ao mesmo tempo que a distorcem, criando mal-entendidos e alimentando processos de intenções. Depois CLeone afirma que «as leis não devem inculcar moralidade» e portanto o divórcio não deve suscitar «sanção moral». Concordo ao mesmo tempo que lamento que em certos meios algumas pessoas continuem a ser mal vistas por se terem divorciado.
Quanto ao projecto do PS, do qual hoje o Público traz mais notícias, só posso concordar com duas inovações que visam «proteger as partes mais frágeis» da família: «o não cumprimento culposo dos deveres parentais passa a ser crime de desobediência. E o trabalho da mulher a favor da família pode passar a ser compensado economicamente no momento da partilha dos bens». Isto não me impede objectar ao princípio do projecto de lei, princípio que é resumido no Jornal de Notícias da seguinte forma: «o juiz vai deixar de considerar os deveres do casamento para determinar a dissolução do mesmo». Eu não gosto de viver numa sociedade em que os meus deveres para com o Estado, que tem muito mais poder do que eu, são levados muito a sério e os meus deveres livremente assumidos para com outra pessoa, numa relação de igual para igual, são considerados irrelevantes.

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sábado, abril 05, 2008

Divórcio e responsabilidade

A minha ignorância de questões técnico-jurídicas, tem-me mantido afastado do debate em torno das alterações à lei do divórcio. Porém, a consciência da ignorância própria, não me impede de ver o dislate alheio. Rapidamente a questão perde um carácter jurídico e resvala para o campo metafísico-filosófico. Neste caso o problema metafísico é o de haver ou não haver culpa. Parece que a proposta do PS pretende afastar o conceito de culpa e decretar o divórcio imediato em caso de violação dos direitos fundamentais de um cônjuge. Se alguém não é culpado por violar os direitos fundamentais de outra pessoa, então o que é a culpa? Muitos divórcios são legitimados pelo conceito de culpa. Incluindo a culpa de, desde o início, querer um «casamento de fachada». Concordo que não faz sentido culpabilizar uma pessoa apenas porque deixou de amar outra. Daí a declará-la irresponsável em caso de divórcio vai uma grande distância. Se uma pessoa se quer divorciar porque deixou de amar o cônjuge é responsável por quebrar uma promessa e defraudar as legítimas expectativas de outra pessoa. Quem não quer as responsabilidades inerentes ao casamento tem boa solução – não case.

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quarta-feira, junho 13, 2007

O catolicismo irreal no país real

Os louvores do Público de segunda-feira aos CPM (Cursos de Preparação Matrimonial), com declarações embevecidas de participantes e monitores, desencadearam em mim uma série de reflexões que desembocaram neste post. Como os leitores regulares deste blogue já perceberam, casei recentemente pela Igreja Católica. Sempre encarei o casamento como uma decisão que podia tomar num determinado momento da minha vida e não como um dever ou um objectivo. Quando imaginava, em abstracto, a cerimónia, achava que o mais provável é que fosse uma «seca». As minhas expectativas foram completamente defraudadas, pelas melhores razões, pois gostei bastante de preparar e celebrar o casamento e, agora, aprecio recordá-lo.
Mas este não é um post confessional e intimista. O casamento é também um acto eminentemente social, revelando-nos bastante da sociedade e da Igreja em que vivemos. Foi com surpresa que descobri, por exemplo, que o simplex eliminou as assinaturas do casamento civil. Acho esquisito. Um homem contrai um dos contratos mais importantes da sua vida e nem sequer assina. Dizem-me que a novidade vem de boa tradição, nomeadamente da boa fé dos anglo-saxões nos cidadãos. Não discuto a bondade da tradição, mas registo uma certa inconsequência face às dificuldades de divórcio vigentes em Portugal. Imagine o leitor solteiro que um desconhecido se apresenta numa conservatória com um bilhete de identidade falsificado, a passar por si, e uma mulher disposta a casar. De súbito, face à lei portuguesa, passa a estar casado e para se divorciar é uma embrulhada.
O contacto com a burocracia da Igreja também foi uma surpresa, nem sempre agradável. Não me refiro, como é óbvio, aos padres convidados para presidir à cerimónia, nem a algumas pessoas bastante simpáticas que tratam dos aspectos administrativos. O padre da paróquia da minha mulher, por exemplo, fechou-se connosco numa pequena sala e deu-nos um sermão de uma meia hora, apimentado com um humor peculiar: «vão casar até que a morte os separe…e nenhum de vocês vai matar o outro, não é?» Os tais CPM, que o Público tratou com tanta reverência, alimentaram o repertório de anedotas de alguns amigos nossos que casaram há pouco tempo. São histórias que para mim, entregue desde tenra infância a um «catolicismo esclarecido», levantam a ponta do véu sobre o «catolicismo irreal» do «país real».
Uma história contada em CPM na paróquia de Benfica, em Lisboa: «Depois do jantar, a mulher quer lavar a loiça e o marido quer ir ao cinema. O que é que devem fazer? Resposta certa: a mulher deve lavar a loiça mais cedo e ir com o marido ao cinema.» Esta história tinha uma variante subtil: «A mulher fica em casa a lavar a loiça. O marido vai ao cinema e trai a mulher. De quem é a culpa? Resposta certa: a culpa é da mulher.» Valha-nos Deus.


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