segunda-feira, abril 07, 2008

O Club de Mark Eitzel

A capa aqui ao lado é a de Mercury, o melhor disco do American Music Club, um pseudónimo de Mark Eitzel (por isso o melhor é consultar o site pessoal para informações dos discos do grupo ou dos que assinou a solo):
http://www.markeitzel.com/ (Mercury, apesar do que está no site, é de 1993).
Mas dizer «o melhor» é pouco importante, a produção média é tão estável que entre este e os da mesma década (San Francisco, Everclear), os da década anterior (Engine e California, pelo menos) e os da década actual (como o que os trouxe ao Santiago Alquimista em 2005, Love Songs for Patriots), nem é necessário escolher. Além do mais, Eitzel a solo, desde 60 Watt Silver Lining (1996) até Candy Ass (2005, se não erro) tem um som praticamente igual ao «clube». No novo, acabado de surgir, The Golden Age, o American Music Club retoma mesmo uma canção do último album a solo de Eitzel, com arranjos mais elaborados. Eu preferia «The Sleeping Beauty» na versão de Candy Ass, tocada ao vivo por Eitzel (desta vez a solo) também no Santiago Alquimista numa versão ainda mais minimal. Mas faz sentido: Eitzel é sobretudo um poeta, com um talento para interpretar as suas coisas graças a variações no uso da voz e com um sentido de gosto muito estável em matéria musical; as mudanças instrumentais apenas ajustam a música a um grupo em vez de a um único intérprete.
A música de The Golden Age, cuja capa impecavelmente kitsch aqui não reproduzo de propósito (só a vendo por completo, abrindo o CD, se percebe a piada, coisa que é costume negar às coisas de Eitzel em nome de um suposto dramatismo), é American Music Club no seu melhor: letras de um dos melhores letristas americanos (como Lou Reed, Tom Waits, Stephen Merritt e poucos mais), rock escuro, adulto, por vezes completamente irónico (arranjos como sempre muito discretos), som perfeitamente coerente mas capaz de se refazer para ser tocado em palco (Eitzel tem até um CD intitulado The Ugly American, maioritariamente composto de canções do AMC arranjadas com instrumentos tradicionais gregos...). Um dos melhores discos do ano, sem reservas. Nunca é de esperar menos de quem gravou, há 20 anos, «Outside this Bar».
Voltarão cá?

(Apenas uma nota, muito lateral: para aferir do estado da crítica de música em Portugal, comparar o que um crítico do Público escreveu este fim de semana sobre Karajan e o que, no mesmo local, escreveu um músico.)

Etiquetas: , , , ,

quinta-feira, abril 03, 2008

R.E.M., versão «economy class»

Eu devia ter suspeitado quando li o elogio no Público... Basicamente, o novo disco dos R.E.M. está para a sua música como os filmes «negros» da fase londrina de Woody Allen estão para o seu cinema: apreciados por quem não gosta do que eles fazem melhor. Allen é um autor como há poucos, mesmo muito poucos, e quem perpetra crítica de cinema hoje geralmente nem tem idade para ter acompanhado uma Obra monumental (isso mesmo também se viu nas críticas surgidas na imprensa de referência ao seu livro mais recente). E algo semelhante sucede com os R.E.M.
Para quem começou a ouvir R.E.M. com o sucesso radiofónico de «Losing My Religion» (óptima canção, e bem dentro do estilo «clássico» do grupo), em 1991 ou 1992, nada daquilo lhe era familiar. Não por acaso, a canção fazia parte de um album intitulado Out of Time. Por isso é apenas lógico que o novo Accelerate soe bem a ouvidos criados a golpes de Nirvana e afins: demasiado rápido e demasiado gritado, curto e monótono, enérgico e feito para ser tocado ao vivo. Mas sem ocupar demasiado tempo, há muitas outras músicas para tocar... E o ponto é esse: song per song, os R. E.M. têm o CV mais impressionante do rock americano. Espalhadas por quase 30 anos, por dezenas de gravações e por dois alinhamentos (com e sem o baterista), definiram um som fundamental para reviver o rock americano nos anos '80 (no final dessa década eram macaqueados a torto e a direito por bandas independentes) e, nos anos '90, refizeram-no livremente apesar do contrato monstro com uma grande editora. O sucesso público de Out of Time, a perfeição de New Adventures in Hi-Fi (quando o «Lo-Fi» era moda, fizeram o seu melhor disco... como os Sonic Youth e os U2, duas outras bandas dos anos '80 que culminaram nos '90's), a reinvenção espantosa do line-up original em Up, enfim, o conjunto do que fizeram até hoje é um sucesso quase incomparável, apesar de flops ocasionais (Green nos 80's, Monster nos 90's e Reveal já nesta década). E para dar conta desse sucesso teria de fazer uma lista, com mais de 30 títulos, de canções mais-que-perfeitas, coisa que agora não me apetece.
Isto porque, infelizmente, o novo disco pouco contribui para essa longa história. Começa, verdadeiramente, só na terceira canção. E nunca passa muito do registo mono-tom referido acima. A comparação fácil é com Life's Rich Pageant (80's) e Monster (90's). Infelizmente, tem muito mais do segundo do que do primeiro. Ou seja: esprimido, não é um album (como Life's...), mas um «maxi» ou, vá lá, um EP.
Vale a pena? Sim. É um grande passo em frente em relação ao último disco? Não, esse era apenas demasiado longo (este é bastante curto apesar das duas primeiras faixas escusadas, sobretudo a segunda). Isto, claro, não é grave. Quebrar o silêncio de quatro anos só com isto é que é pior. Para uma perspectiva, há esta devidamente autorizada (restrita, ou quase, aos anos na Warner, no site oficial).
Para um grande comeback, contudo, temos o novo dos American Music Club...

Etiquetas: , ,

sábado, março 29, 2008

20 anos depois


Ou perto disso. Deve ter sido por 1988 que ouvi falar pela primeira vez dos Pylon. Foi no booklet de Dead Letter Office, album de lados b e afins dos R.E.M., onde Peter Buck comentava como, nos primórdios do grupo, não deixava de invejar os seus conterrâneos de Athens, Georgia.
Agora surge (ed. DFA, distribuição Sabotage, encontra-se na FNAC a preço decente) Gyrate Plus. Um CD com o album dos Pylon de 1980 (Gyrate) e mais dois singles e um inédito. Parece que agora os Pylon, quarteto que rapidamente se desfizera, se reuniram, há mesmo um site (wearepylon.com) para os interessados. Santiago Alquimista, por que esperas?

A música dos Pylon, e em particular a de Gyrate, é merecedora de todos os elogios de Buck e dos de Michael Stipe (R.E.M.), Fred Schneider (B52's) e Hugo Burnham (Gang of Four), no booklet deste Gyrate Plus (inclui as letras das canções). A música, à falta de uma definição exacta, é qualquer coisa como a fusão do Colossal Youth dos Young Marble Giants com o Fear of Music dos Talking Heads. Assim tão bom, ser tudo da mesma época não pode ser coincidência.

O mais sério candidato a melhor disco de 2008, até ao momento, é um CD de música com quase 30 anos (e não quero saber que este CD tenha saído em 2007). Mas há que ouvir pelo menos o novo dos R.E.M. e o novo dos American Music Club. De qualquer modo, assim o ano está já garantido.

Etiquetas: , , ,