quinta-feira, maio 25, 2006

Esplanemos

Aguardei serenamente o final do julgamento de João Pedro George. Ou melhor, e para ser rigoroso, com certa inquietação. (Mas ainda assim gosto da expressão serenamente). Cheguei a temer que fosse negado ao sociólogo da cultura, ao crítico literário a possibilidade de chamar os bois (e respectivas companheiras) pelos nomes. Algo evidentemente sem sentido. Era como se, por exemplo, um matador de toiros não pudesse legalmente matar toiros! Fiquei, portanto, satisfeito com o veredicto no caso das couves e das alforrecas.

Quanto ao veredicto crítico da literatura pop assente na denúncia de que ela é repetitiva da parte de JPG parece-me ser, não merecedor de condenação em tribunal (claro), mas um pouco curto. (Sendo que não li, por manifesta impossibilidade, o livro de horticultura marítima). Afinal por que é que tantos leitores lêem textos tão repetitivas? Essa parece-me ser a pergunta essencial.
Já o Umberto Eco dos velhinhos Apocalípticos e Integrados apontava para a repetição como característica central de toda a literatura pop: dos folhetins novecentistas, ao Super Homem, incluindo, claro, o aniversariante Sherlock Holmes. Há uma certa diferença - no engenho e arte - entre o "elementar meu caro Watson" e o auto-plágio puro e simples. (Cuja descoberta, há que reconhecê-lo, devemos ao trabalho de JPG). Mas o efeito sociológico de manada parece ser semelhante. Os leitores de Margarida Rebelo Pinto iam ao engano? Ou muito me engano, ou compravam aquilo que queriam. A fidelidade com fidelidade se paga: o fiel leitor de best-sellers quer saber o que o espera, não quer novidades, quer mais do mesmo.

2 Comments:

Blogger Pedro Picoito disse...

Exactamente. Concordo por inteiro com a análise. O trabalho do JPG é muito meritório, mas a crítica literária não é isso ( e quer-me parecer que a sociologia da literatura também não). Embora me tenha dado um certo gozo ver revelados os pés de barro da MRP, talvez a parte de si mesma que ela menos gosta de ver revelada, a crítica (e a sociologia) seria mais certeira se perguntasse pelas razões do seu sucesso.

4:02 da tarde  
Blogger João Miguel Almeida disse...

Concordo contigo. E acrescento que a repetição não é só uma característica da literatura pop. Pode ser um recurso estilístico de grandes escritores. Javier Marias, por exemplo, constrói os romances «Amanhã na batalha pensa em mim» e «Coração tão branco» em volta de frases de Shakespeare que vão sendo repetidas e ganhando novas conotações em novos contextos criados pela progressão da narrativa. E José Luís Peixoto usa a repetição com força poética.
Marguerite Duras, que eu conheço pior, podia ser outro exemplo. Se em MRB a repetição aparece como «bengala» é devido aos seus fracos recursos de escritora.

9:27 da manhã  

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