segunda-feira, setembro 18, 2006
Abri o primeiro número do Sol, com humildade. Na minha mente ainda ecoava o anátema de Carlos Pinto Coelho em relação à blogosfera, que acusava de estar infestada de escribas adolescentes e de almas solitárias. José António Saraiva justificou, recentemente, em entrevista a Judite de Sousa, a célebre esperança de ganhar o Nobel: as pessoas devem sempre tentar superar-se, colocar-se a meta mais elevada. Imaginem, portanto, a minha surpresa ao ler a entrevista a Filomena Mónica em toda a segunda página do novo semanário. É que as declarações a um jornal de referência de uma socióloga de 63 anos, investigadora do Instituto de Ciências Sociais e autora de diversos livros deviam encontrar-se nesse patamar superior. Vejamos o que afirma a senhora: «O corpo de José Sócrates deve ser bem feitinho. O doutor Mário Soares está muito gordo, mas também já é velho…». O resto do texto encaixa na mesma onda, embora com menos acutilância. Felizmente, a maior parte dos blogues que leio está muito acima deste nível. Maria Filomena Mónica não se enxerga. Critica os jornalistas e os políticos portugueses por não serem como os britânicos. Mas já alguém leu entrevistas destas dadas por historiadores e sociólogos do Reino Unido a jornais de referência? Imaginamos Eric Hobbsbawn a ocupar uma página do Times para dizer que Tony Blair é um tipo sem piada, pois tem o perfil de pai perfeito de família, e que John Kennedy tinha pinta porque foi para a cama com a Marilyn Monroe? Há uma frase de Aquilino Ribeiro que já não sei onde li e cito de cor: o mal de Portugal não é quem tem olho ser Rei. O mal é quem tem dois olhos furar um para ser Rei. A nossa aristocracia intelectual, mesmo com os dois olhos intactos, não me consola.
12 Comments:
Da parte da investigação, parece que a senhora já se reformou. Excepto para a Caixa Geral de Aposentações, não faz muita diferença. Investigar é coisa que nunca fez particularmente bem. A senhora sempre confundiu investigar com sentenciar.
Uma imbecil; Fallaci à portuguesa.
Só não percebo a surpresa, atendendo ao curriculum da entrevistada nesta matéria de declarações geniais (maxime a autobiografia). É aliás uma escola, e te apreciadores que já se manifestaram embevecidos com estas pérolas...
CL
Coisa que nunca entendi, é porque é que esta Maria Filomena Mónica é pessoa tão querida e conceituada nos nossos mídia. Porque é que as suas crónicas ou opiniões são facilimamente e repetidamente publicadas em qualquer jornal, quando o comum dos mortais tem imensa dificuldade em ver a sua opinião publicada num jornal. Que torna a MFM tão querida dos mídia? Porque ligam tanta atenção às suas opiniões e dislates? Alguém me sabe explicar?
Luís Lavoura
Peço desculpa, mas gosto da Filomena Mónica. Acho-a inteligente e corajosa. Não quer dizer que concorde sempre com ela ou que ache de grande qualidade tudo aquilo que faz. Tem obra como historiadora - goste-se ou não, e eu gosto - coisa que muitos dos seus críticos não só não têm como duvido que alguma vez venham a ter. E o que é mais grave é que muitos deles tem obrigação de ter obra. Também sei que Maria Filomena Mónica teria a vida muito mais facilitada se alinhasse em determinadas artes e pertencesse a certos grupelhos. Gosto da senhora e respeito-a como académica, coisa que me acontece pouco no meio pátrio. A sua coragem, a sua inteligência e a sua frontalidade são coisas raras no mundo pestilento das Universidades onde se move. Tem sempre razão? Diz e escreve sempre coisas acertadas (como historiadora e como "comentadora")? É certo que não. Quem o faz? Mas se o seu discurso fosse outro – não quanto à substância, note-se – muitos que a odeiam não permitiriam que contra Filomena Mónica se levantasse uma única só voz ou se escrevesse uma única palavra.
P.S.: Não li a entrevista Filomena Mónica ao Sol que, aliás, não comprei. Mas li um excerto, salvo erro no Portugal dos Pequeninos. Aquilo que lá vem está longe de me parecerem "dislates". Antes pelo contrário.
P.P.S.: Já agora gostava de conhecer a razão pela qual anda toda a gente a dizer mal do Sol. Do que é estavam à espera? Do Sunday Times ou do Observer de há dez ou quinze anos?
«Maria Filomena Mónica não se enxerga. Critica os jornalistas e os políticos portugueses por não serem como os britânicos.»
Concordo totalmente. ;)
"E o que é mais grave é que muitos deles tem obrigação de ter obra."
Caro Fernando Martins:
Será que podemos ter nomes dessa casta de malandros preguiçosos, intriguistas e despeitosos?
Ou seja, se isso é mesmo materializável em pessoas de carne e osso?
Qualquer coisa de mais concreto?
Um nome, ao menos, sff?
Era capaz de ser útil. De ser, digamos, mais terreno e menos abstracto.
Ademais, comentar sem ter lido o 'texto' que se comenta tb. é interessante, mt. luso.
Um nome, ao menos, pode ser?
"Também sei que Maria Filomena Mónica teria a vida muito mais facilitada se alinhasse em determinadas artes e pertencesse a certos grupelhos."
Agora a sério, não me parece que MFM tenha a vida particularmente dificultada, nem que esteja condenada ao ostracismo. Muito pelo contrário: o simples facto de ter posto as suas memórias à venda e com o sucesso que se viu, já diz muito. Além disso, não há semanário, diário ou vespertino onde a senhora não apareça, como colunista ou entrevistada.
A página 2 do Sol teria a sua piada, mas era para ser posta no fim, não em lugar de destaque. E isso mostra a vacuidade do jornal.
"não há semanário, diário ou vespertino onde [Maria Filomena Mónica] não apareça, como colunista ou entrevistada"
É precisamente este facto que eu gostaria de ver explicado. O comum das pessoas tem muita dificuldade em aparecer como colunista ou entrevistado num qualquer jornal. Porque é que MFM tem tal acesso aos mídia? O que a torna uma pessoa tão privilegiada?
Não será certamente, apenas nem mesmo principalmente, a sua inteligência, o seu saber, ou a qualidade do seu trabalho - uma vez que em todos estes aspetos há muita gente melhor do que ela.
O que será, então?
Luís Lavoura
Daniel, não sou queixinhas mas, e sobretudo, não me parece que adiante alguma coisa para a discussão apontar nomes. Faça o Daniel um esforço. Se se lembra de alguém, óptimo, se não se lembra de ninguém, óptimo na mesma. Certo é que a sua posição está tomada cite eu um ou cem nomes.
Quanto ao facto de eu não ter lido a entrevista e mesmo assim ter-me pronunciado sobre ela, devo dizer em minha defesa que, por um lado, o reconheço e não estou a enganar ninguém - sendo que o que é muito "luso" é falar de algo como se se tivesse lido ou visto, sem nunca se ter lido ou visto a coisa. Por outro lado, aquilo que comentei no meu comentário não foi a "entrevista" de MFM ao Sol, mas as críticas de que a professora normalmente é alvo e que a mim me parecem normalmente injustas e injustificadas. Ainda me lembro, no saudoso Barnabé, o "historiador" Rui Tavares chamar-lhe a Himmelfarb portuguesa. Uma afirmação como esta apenas queria apenas dizer que o "historiador" Tavares - que na altura ainda não se autodesignava dessa forma - ou não tinha lido Himmelfarb, ou não tinha lido MFM, ou tinha lido as duas mas não percebia nada daquilo que lia. E por aqui me fico. Se o Daniel quiser mandar vir mais qualquer coisa é só dizer. Aqui no Amigo do Povo o cliente está sempre primeiro. Só não tem sempre razão porque gostamos de uma discussão e cliente certamente também.
Para quem não queria fazer queixinhas, não está mau.
Eu pensava que era fruta fresca, mas estou a ver que é como em alguns restaurantes de serviços, ao jantar é comidade requentada.
Nem sempre se pode ter do melhor.
Enfim, tem dias, quer dizer, alturas do dia.
Só objectar que não tomei posição nenhuma, só pleguntei, e que essa história das aspas faz-me lembrar a do hífen no marxismo-leninismo.
Já o mandar vir está bem apanhado.
Já que estamos nessa, eu prefiro os posts sobre beijoquices do Fernando a estas fixações estapafúrdias.
Caro Daniel,
No que a este nosso diálogo diz respeito só posso acrescentar uma velha máxima comercial: "o freguês tem sempre razão."
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