sexta-feira, fevereiro 24, 2006

A Trapalhada do Choque das Civilizações


Digam-me de que forma se explica o conceito de choque de civilizações, em versão "popular" ou "académica", olhando para a guerra civil iraquiana envolvendo sunitas e shiitas (todos pertencentes à chamada civilização islâmica). É que nem sequer é a primeira. E certamente não será a última!

3 Comments:

Anonymous Anónimo disse...

Eu julgo que a unica razao pela qual tanta atencao e' dada ao "choque de civilizacoes" e' o autor ser professor em Harvard. Tem muitos amigos importantes e influentes. E o poder fascina.

2:29 da tarde  
Blogger Rui Fernandes disse...

post publicado em caetera.blogspot.com

Não sei se o Fernando Martins considerará esta resposta de tipo popular ou acadêmico, e para dizer a verdade é algo que não me apoquenta (utilizando o verbo tão querido a minha cara Cláudia Vicente blogger no mesmo burgo). A primeira coisa que se deve ter na cabeça a propósito de qualquer teoria ou modelo no âmbito da política internacional ou do que quer que seja, é que se tratam sempre de caricaturas úteis, ou pelo menos isso pretendem ser. Caricaturas porque não se pretende explicar tudo com o modelo, e mais exactamente se deverá por isso no preâmbulo da própria caricatura especificar exactamente o que se pretende ser capaz de caricaturar.

Assim antes de mais nada se deverá dizer que tal como é previsível mesmo para quem não tenha lido Huntington, a sua ideia de guerra de civilizações pretende descrever o cenário actual em que se inscrevem os conflictos internacionais entre Estados. Será por exemplo sempre admissível que em um dado Estado questões sociais e econômicas levassem a uma guerra civil que a teoria de Huntington não pretende abarcar.

Por outra parte o Fernando reconhecerá que curiosamente no conflicto que ele refere existem algumas questões fundamentais que sim intersectam com temas civilizacionais. Os xiitas são dentro da religião muçulmana uma corrente religiosa à parte, de facto, são a corrente religiosa à parte para os muçulmanos, em geral, sunitas. No contexto de civilizações definidas por sua religião, os xiitas e sunitas no Iraque constituem se se quiser duas subcivilizações em confronto. Isto explica a ambiguidade de muitos países árabes, sunitas, em admitir a legitimidade do actual governo iraquiano, democraticamente eleito, mas essencialmente xiita e curdo, ou seja, dominado por uma combinação de subcivilizações distintas do mainstream civilizacional muçulmano. Explica também que o apoio ao actual governo para além dos países ocidentais ocupantes venha dos demais países xiitas: Irão e Síria. Neste sentido o conflicto xiita e sunita iraquiano se insere numa óbvia lógica civilizacional também.

Tudo isto para além do facto da insurgência sunita ser contra xiitas mas também contra as potencias ocidentais ocupantes, e contra os xiitas em grande parte também enquanto estes são os colaboradores com a ocupação, e não apenas, portanto, numa base de lógica partidária do antigo regime. Além disso esta insurgência recebe apoio logístico e humano dos demais países muçulmanos, incluindo da Al Qaeda, que nunca teve especial boa relação com o Irão xiita por exemplo, para lutar contra o Ocidente imperialista, contra os hereges xiitas, e contra os xiitas traidores amigos do Ocidente decadente. Até mesmo os apoios clandestinos que supostamente o Irão presta a insurgência devem apenas ser vistos com base em uma sublógica maquiavélica, que nós ocidentais estamos muito habituados, ao serviço da expulsão dos americanos o antes possível, e ao serviço, portanto, da guerra civilizacional mais importante, que é a que o Irão desde os tempos Komeini assumidamente mantém com o Ocidente.

A teoria de Huntington provavelmente não se aplique a tudo, seguramente que não, mas o Fernando Martins teve azar em vários sentidos no exemplo que foi buscar.

12:58 da manhã  
Blogger Rui Fernandes disse...

Antes que me apontem o dedo, sou o primeiro a reconhecer que cometi um erro crasso ao incluir Siria nos países que apoiam a actual administração iraniana e como sendo um país xiita, quando na realidade apenas uma pequena população xiita e não é particularmente apoiante do governo democrático iraquiano, mas apenas do actual Irão por razões óbvias.

1:23 da manhã  

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