quinta-feira, abril 27, 2006

24, 25 ou 26?


Escrevi no 25 de Abril um post com duas perguntas. Fi-lo, essencialmente, por um par de razões. Em primeiro lugar porque queria ver se conseguia ler respostas que fossem além daquilo que normalmente se nos depara nos media. Em segundo lugar, porque uma vez que se começam já a preparar as comemorações dos 100 anos do 5 de Outubro, e nelas deverei participar como “professor” do Departamento de História da Universidade de Évora e “investigador” do CIDEHUS, tenho-me perguntado: “O que é se comemora quando se comemora o 5 de Outubro?”
Não sou ingénuo ao ponto de pensar que as minhas perguntas não iriam ter as respostas que globalmente tiveram. Defesa cega da bondade do evento, ataques apaixonados às desgraças que produziu, impropérios àquele que ousou perguntar – que vão desde o “fascista” puro e duro até uma espécie de singelo nostálgico do antigamente. Como é fácil imaginar tudo isto me diverte.
Tratando-se de um par as razões que me levaram àquelas duas perguntas, avanço para a revelação da terceira: saber como é que, eventualmente, os meus leitores reagiriam ao facto de se interrogar o “25 de Abril” de forma simples, directa mas, ao mesmo tempo, na sua essência. Neste caso devo dizer que fiquei com a certeza de que para os defensores da bondade do “25 de Abril” o “25 de Abril” não se questiona.
Por isso, e só por isso, mas já é muito, e independentemente das vantagens indiscutíveis que a queda de Marcello Caetano também nos trouxe, a verdade é que apreciei a atitude de Alberto João Jardim e do PSD Madeira ao decidirem que naquela região autónoma não se fizessem comemorações oficiais do 25 de Abril e que também mereceu um post meu no mesmo dia. Acto provocatório o de Jardim? Certamente! Mas acima de tudo acto de liberdade e de rebeldia face ao pensamento dominante – oficial e oficioso – que sustenta a natureza inquestionável do 25 de Abril. É que o 25 de Abril só será aquilo que os seus defensores incondicionais à “esquerda” dizem que é quando naturalmente aceitarem que pode e deve ser questionado de uma ponta à outra. Ora aquilo que obviamente as minhas perguntas demonstraram, a julgar pelas respostas dadas em dois posts e uns quantos comentários, foi que os defensores do 25 Abril de 1974 tardam em assimilar aquelas que garantem terem sido as suas virtualidades. Nesse aspecto, como noutros, estão mais no 24 do que no 26 de Abril.

10 Comments:

Blogger Luís Aguiar Santos disse...

Yes!

2:30 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

oh pá!!! Não se comemora porra nenhuma, mas com sorte dá para fazer umas mini-férias.
Não tens nada de mais interessante para te interrogares? Se nos lixarem os feriados a culpa é tua e das tuas dúvidas de metafisica dos costumes...Vai para a praia e esquece isso!!!

2:51 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Fernando Martins,

Compreendo o seu desapontamento em relação aos comentarios (incluindo uma pequena e despretenciosa nota minha) suscitados pelas suas duas perguntas sobre a comemoração do 25 de Abril. Até julgo partilhar a sua reserva "face ao pensamento dominante – oficial e oficioso – que sustenta a natureza inquestionável do 25 de Abril."

Mas confesso que ainda não percebi bem qual é a sua perspectiva do acontecimento historico (e não apenas sobre a oportunidade ou não em se comemorar hoje tal data e sobre "a atitude de Alberto João Jardim e do PSD Madeira"). Para além da sua referencia às "vantagens indiscutíveis que a queda de Marcello Caetano também nos trouxe".

Se porventura ja escreveu sobre o assunto, peço desculpa por não estar ao corrente, e agradeço que me diga onde posso consultar o ou os seus textos.

2:56 da tarde  
Blogger Fernando Martins disse...

Caro/a anónimo/a,
Infelizmente não pude ir para a praia durante o fim de semana, ponte e feriado. Talvez vá no Domingo ou na Segunda. Veremos!
Fernando S.,
Não me parece muito relevante dizer se o 25 de Abril foi bom ou mau e, portanto, apresentar o meu juízo de bloguista. O 25 de Abril, e o que se lhe seguiu, aconteceu e pronto! O que me interessa é compreendê-lo e, ao mesmo tempo, embora noutro plano, dar um pouco de luta àqueles que simplistica e ilegitimamente se querem apropriar da comemoração de uma data que, caso tenha tido o significado que nos dizem ter tido, não é propriamente de ninguém. Mas esta "luta", descanse, não pretende dar resultados concretos. E já agora, volte sempre!

3:07 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Caro Fernando Martins,
Agradeço a sua resposta.
Como ja disse, até simpatizo e partilho [com] a sua "luta" contra os que "se querem apropriar da comemoração de uma data [o 25 de Abril]”. Mesmo que seja uma luta ingloria !
Respeito a sua posição quanto ao facto de não lhe parecer "muito relevante dizer se o 25 de Abril foi bom ou mau". Muito embora não tivesse sido bem isso o que lhe pedi. O Fernando é que fez as perguntas ! ... Eu apenas sugeri que também respondesse às mesmas !... Satisfaça-me apenas a curiosidade : escorregou-lhe o pé para o "irrelevante" quando se referiu às "vantagens indiscutíveis que a queda de Marcello Caetano também nos trouxe" ? Ou falar de "vantagens" não é fazer juizos ?
Pelo meu lado não percebo muito bem o que é "compreender" fazendo abstracção de quaisquer critérios valorativos. Mesmo que estes fiquem em segundo plano e não se sobreponham à frieza dos factos e da analise. Eu também procuro a distancia critica, mas não acredito numa qualquer objectividade absoluta. A sua indignação (moral !) perante o facto historico que é o "pensamento dominante" sobre o "25 de Abril" é prova disso. E, ja agora, o que é "questionar o 25 de Abril" senão reclamar a possibilidade de outros juizos, por mais objectivados que sejam, sobre um acontecimento ou sobre aspectos parcelares desse acontecimento ?
Até pode ser que esta diferença de atitude tenha menos a vêr com diferenças intelectuais e ideológicas (se não me engano, em relação a si, nenhum de nós é verdadeiramente “de esquerda”) e mais com diferenças de gerações. Eu serei eventualmente mais velho do que o Fernando. Embora muito modestamente, como milhões de outros portugueses, fui protagonista daqueles acontecimentos históricos. Fazendo juízos de valor e tomando partido. Não importa agora quais. Posso compreender que para gerações mais novas o “25 de Abril” apareça agora tão só como um facto para analisar e desmistificar.
Dito isto, não vou insistir em algo que lhe parece "irrelevante". Peço-lhe desde já desculpas por ter voltado ao tema. É problema meu, a sua perspectiva é o que é, "e pronto", como diria o Fernando !...
Continuarei naturalmente a visitar o vosso Blog e a ler os seus Posts com interesse. Quanto mais não seja,
por me parecerem estar à revelia do "politicamente correcto" e imbuidos de uma certa perspectiva historica (que percebi agora, pela referencia à Universidade de Evora, ter igualmente uma razão profissional). Descobri o vosso Blog ainda ha pouco tempo. Copiei um debate aqui tido sobre a questão colonial e a descolonização, com uma importante participação sua. Trata-se de um tema que me interessa muito. Logo que tenha algum tempo vou ler o que escreveram e talvez isso me ajude a compreender algo mais sobre a sua leitura de acontecimentos de algum modo historicamente ligados ao 25 de Abril de 1974.
Um abraço.

4:44 da tarde  
Blogger Fernando Martins disse...

Muito obrigado Fernando S. pela sua paciência e pela sua leitura atenta, já para não falar no teor dos comentários.
Ando um bocado a fugir com o "rabo à seringa" naquilo que diz respeito à "avaliação" que faço do 25 de Abril. De qualquer modo, e para que conste, também penso que "compreender" significa produzir juízos de valor. O que acontece é que não me apetece fazer um juízo sério porque não me sinto capaz. Quero soretudo fazer perguntas, recolher respostas, tentar pôr em causa - modestamente - o pensamento dominate, produzir eu próprio eventualmente algumas respostas, mas nada mais do que isso. Peço-lhe que me desculpe - se for caso para tanto. Acho que o 25 Abril, do ponto de vista histórico, e até do ponto de vista político-ideológico, merece, acima de tudo, bons livros e bons artigos que globalmente ainda não foram escritos. O resto tende a deixar-me bastante insatisfeito.

6:20 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Caro Fernando Martins,
Aprecio a franqueza e a honestidade das suas palavras !
Um abraço.

8:56 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

"É que o 25 de Abril só será aquilo que os seus defensores incondicionais à “esquerda” dizem que é quando naturalmente aceitarem que pode e deve ser questionado de uma ponta à outra."

So' falta admirarmos o espirito critico historico com que o Alberto Joao abordou o significado dos festejos do 25 de Abril. Assim se enriquecem a cultura e o espaco publico em Portugal. Obrigado, Alberto Joao! E, ja' agora, obrigado tambem, Fernando Martins!

9:42 da tarde  
Blogger sabine disse...

Compreendi o sentido das suas duas perguntas mas esta terceira -
"Quem é o cidadão boçal que está a fazer o discurso de comemoração do 25 de Abril na qualidade de deputado do Bloco de Esquerda?"
Confesso que me deixou um pouco baralhada. Qual era o sentido da 3ª?

11:48 da manhã  
Blogger João Miguel Almeida disse...

Caro Fernando,

Respondi de forma sucinta mas suficiente às tuas duas perguntas. Agora colocas uma terceira e respondes à tua própria pergunta seguindo um raciocínio que, do meu ponto de vista, é incompreensível.
A minha resposta à terceira pergunta está implícita no meu post, mas convém explicitá-la, além de explicar a minha incompreensão.
Essa ideia de que o 25 de Abril é inquestionável não faz qualquer sentido para mim. Quando comecei a reflectir sobre a História mais recente de Portugal, lembrei-me, num intervalo das aulas do colégio S. João de Brito, de perguntar aos meus colegas de turma qual é que consideravam o melhor regime político para o nosso país: democracia ou ditadura. Nem todos os meus colegas se encontravam na sala de aula nesse momento. Mas eu era o único que defendia a democracia. Isto em 84 ou 85.
Foi o meu primeiro «insight» político.
Não só te reconheço o direito a questionar o 25 de Abril neste blogue como até acho positivo um debate sobre o acontecimento. Mas o debate tem de se fazer sobre respostas e interpretações divergentes. Além do 25 de Abril ser discutido, os seus valores são negados por movimentos organizados que, no poder que exercem, felizmente fora do Estado, recusam aos outros a liberdade de se exprimir e de agir. É exactamente por isso, repito, que se deve comemorar o 25 de Abril. Eu não só acho que a data é questionável, como penso que os valores que representa - liberdade e uma concepção de desenvolvimento associada à justiça social - podem desaparecer da nossa sociedade.
Não creio que o 25 de Abril seja monopólio da esquerda - acho que é exclusivo daqueles que acreditam nas diversas concepções de democracia. Por isso remeti para o discurso da Cavaco Silva.
Corajoso, Alberto João? O que é que ele arrisca? O que é que ele tem a perder? É ele quem define o discurso dominante na Madeira. Eu admiro os que, encontrando-se nas margens do poder, não abdicam do direito à opinião.

2:55 da tarde  

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