quinta-feira, março 15, 2007

A Filha Rebelde

Estreia hoje, na sala Garrett do teatro D. Maria II, A Filha Rebelde, uma peça de teatro adaptada de um livro de jornalismo de investigação de José Pedro Castanheira e António Valdemar. Ontem, assisti ao ensaio geral. O espectáculo foi ovacionado pelo público. Sendo muito mais dado ao cinema do que ao teatro, não me sinto qualificado para fazer grandes considerações. Mas creio que a peça mostra três méritos que não costumo associar ao teatro que se faz em Portugal: uma história forte com ressonâncias na memória afectiva do público; condensação; um bom naipe de actores.
A história é a de Annie Silva Pais, filha do último director da PIDE, casada com um diplomata suíço colocado em Cuba, que deixa para viver a Revolução de Che Guevara. Durante o 25 de Abril vem a Portugal envolver-se no período revolucionário e visita o pai, que está preso. A peça desenvolve-se ao longo de várias décadas e dois continentes, durando apenas hora e meia. É de aplaudir. Os actores são bons e o conjunto de interpretações equilibrado: Ana Brandão vai bem no papel de Annie; a curta aparição de Salazar é credível; Vítor Norte, como Silva Pais, mostra, uma vez mais, que é um actor consistente; Lídia Franco, de quem não costumo gostar, parece que nasceu para ser mulher do director da PIDE.
Um único aspecto me incomodou: a visão puramente idealista, quase onírica, da revolução cubana, omitindo as suas razões e efeitos perversos. Quem não conhecesse nada da História recente, seria levado a pensar que a «revolução dos cravos» foi mais repressiva do que a cubana, pois levou a uma prisão política – a de Silva Pais – enquanto as perseguições políticas de Cuba não são mencionadas. Um retrato mais realista da situação política de Cuba não esvaziaria de interesse a personagem de Annie, podendo até dar-lhe mais espessura dramática, senão trágica.
Espero que a Filha Rebelde tenha seguidoras no teatro português.