segunda-feira, janeiro 16, 2006

Em louvor do Povo e da República

Ao contrário do Luís Aguiar Santos, gosto da palavra «Povo» e aprecio a República. É claro que esta sensibilidade encontra-se favorecida por ser português. O apoio popular espontâneo transformou o golpe de Estado de 25 de Abril de 1974 na revolução pacífica instauradora do regime democrático. Trata-se de uma diferença significativa em relação a democracias como a alemã ou a japonesa fundadas na sequência de derrotas militares. Não percebo os intelectuais portugueses que olham para os Estados Unidos como um «farol» da democracia, quando este país escudou quarenta anos de ditadura em Portugal e, durante o período revolucionário, suscitou a tese do senhor Kissinger de que uma ditadura comunista lusitana devia ser encarada como uma vacina útil no palco europeu da Guerra Fria.
O povo português tem virtudes notáveis: assimilou facilmente as pessoas que voltaram a Portugal após a descolonização enquanto a França criou o estigma dos pieds noirs após a independência da Argélia; levantou-se em 1999 pela independência de Timor-Leste; contribuiu para o desenvolvimento económico da França, da Alemanha e do Reino Unido. Se as suas qualidades de trabalho não são aproveitadas em Portugal tal deve-se à traição das elites político-económicas apostadas na exploração de uma mão-de-obra barata; preferindo ganhar subsídios da União Europeia para não produzir a criar riqueza; reclamando favores do Estado para manter os «centros de decisão nacionais» mas trocando facilmente os princípios por mais-valias quando surge uma oportunidade de vendar acções a interesses espanhóis.
Os «Elementos de Doutrina Neocartista» do Luís Aguiar Santos valem a pena ser lidos aqui. Sublinho as críticas ao sistema republicano que vai buscar a Hume:

1.º que a eleição do monarca tem, na prática, um factor de “acaso” tão grande como a designação pelo mecanismo hereditário, não garantindo a ocupação do cargo por uma pessoa em si mesma mais inteligente e talentosa (…); 2.º que para chegar a ser candidato e depois a ser eleito, o monarca temporário tem de fazer alianças e aceitar compromissos dos quais nunca se poderá ou saberá realmente libertar durante o exercício do seu mandato (…); 3.º que a escolha eleitoral do monarca, ao contrário da eleição de um parlamento, é um germe cíclico de guerra civil porque requer a constituição de duas ou mais facções rivais de cuja confrontação só uma sairá vitoriosa e ficará representada (…).

Vejamos por que é que prefiro a República: em primeiro lugar, o sistema eleitoral não garante a escolha dos melhores mas, como diria outro liberal, Karl Popper, permite eliminar mais fácil e pacificamente os piores. Convém lembrar que, em dois séculos, este país de «brandos costume» assassinou dois Reis: D. João VI e Carlos I. Em segundo lugar, essa ilusão de que o «monarca temporário» faz alianças e aceita compromissos enquanto o «monarca hereditário» representa a todos é negada pela História portuguesa. Durante os seus últimos anos, a monarquia constitucional portuguesa alienou uma parte significativa do povo português, nomeadamente a pequena-burguesia urbana constituída por professores primários, barbeiros, jornalistas, etc onde grassavam as ideias republicanas. Hoje choca-nos mas em 1908 formaram-se filas de republicanos convictos que queriam apertar a mão aos cadáveres dos regicidas. O último ponto não é uma inevitabilidade. Os eleitores podem e devem evitar colocar na Presidência da República os candidatos que transportam «os germes da guerra civil» e preferir os candidatos que, mesmo tendo um percurso partidário, conseguem mobilizar diferentes sectores sociais e ideológicos.
Iremos discutindo estas questões neste blogue que nasceu em nome da pluralidade e do descontraído confronto de ideias. Por agora, concluo estas considerações com um vibrante: viva o povo português ! Viva a República !

3 Comments:

Anonymous Anónimo disse...

Lembrem-se o regicídio e os que faziam bicha para saudarem os regicidas... os traidores que ergueram o maior logro da nossa história recente. A despótica monarquia aceitava republicanos no seu parlamento. Já a democrática república sovava na rua os monárquicos. Morra a república portuguesa. Viva Portugal!

7:13 da tarde  
Blogger Cláudia [ACV] disse...

Desmandos e destemperos não têm regime favorito nem lhe servem de justificação, Sr. Anónimo.

12:14 da manhã  
Blogger Luís Aguiar Santos disse...

Mas quem tenha mais desmandos e destemperos e quem tenha menos, cara Cláudia...

1:46 da tarde  

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