quinta-feira, julho 20, 2006

50 anos da Fundação Calouste Gulbenkian – 2.ª entrega.


Em carta enviada a Armindo Monteiro, escrita pouco mais de um mês após o falecimento de Calouste Gulbenkian, Oliveira Salazar definiu aquelas que deveriam ser as grandes linhas de acção da Fundação, linhas essas que, no geral, se viriam a cumprir.
Uma vez que o testamento de Gulbenkian dava “uma ideia da finalidade geral” mas “indicação nenhuma acerca da forma como se” deveriam “aplicar os rendimentos da Fundação”, Salazar estava disposto a propor a Azeredo Perdigão que os “rendimentos” não teriam “talvez” de ser distribuídos “pelas numerosíssimas instituições que certamente apresentariam “pretensões e pedidos”, uma vez que tais somas “no fundo pouco adiantariam à vida dessas instituições”. Defendia, isso sim, que seria “preferível tomar nas mãos um problema – ou científico, ou artístico ou de assistência e saúde – e concentrar aí os meios e atenções.”
Sobre a distribuição geográfica da utilização dos fundos da Fundação, Salazar reconhecia que algo deveria ser gasto no Reino Unido, uma vez que Gulbenkian tinha nacionalidade britânica, e na Arménia, já que essa era a sua origem. No entanto, o grosso deveria ser despendido em Portugal uma vez que o facto da Fundação ter sido constituída com sede em Portugal “era o reconhecimento que o sr. Gulbenkian entendia dever ao País pelas condições que a ele lhe permitiram fixar residência, viver e trabalhar pacificamente e aumentar aqui e durante esse período a sua fortuna e rendimentos.” Pelo que concluía: "Não devemos ser egoístas mas parece que Portugal deverá beneficiar generosamente da Fundação. Este ponto é porém delicado e eu não me atrevi a dizer uma palavra a sequer sobre ele ao Dr. Azeredo Perdigão."
Na mesma carta Oliveira Salazar apresentava as suas dúvidas e receios naquilo que respeitava à “liberdade de movimentação de fundos” da Fundação e “acerca do qual” se deveriam “ter hesitações e cuidados.” E depois precisava: “Suponho que, sendo a maior parte, senão a totalidade dos rendimentos da Fundação constituída em dólares, depositados em bancos americanos, se pretende saber se esses dólares podem ser convertidos em libras, através de tal ou tal moeda, aqui ou ali. Também se poderia pôr, e talvez com mais razão, o caso da conversão dos dólares em escudos e sua transformação posterior nas moedas correspondentes às aplicações legais. Devemos pensar que, por favor da Providência e por designação do Sr. Gulbenkian, o nosso país pode contar neste caso com uma reserva potencial bastante interessante em dólares. Não creio poder-se dizer nada a este respeito por ora; suponho porém que os responsáveis pela administração da Fundação também compreenderão interesse para nós do aspecto considerado. [“Carta de Oliveira Salazar para Armindo Monteiro” Lisboa, 25 de Agosto de 1955. AOS/CO/PC – 44C, fls. 31-35 (pasta 1)].
Numa outra carta que escreveu a Theotónio Pereira - na altura embaixador em Londres - dando-lhe conta das suas preocupações sobre o futuro da Fundação, Oliveira Salazar sobre este mesmo tema de natureza financeira e monetária escreveu: “Uma das perguntas constantes do apontamento do Doutor Armindo Monteiro referia-se a um aspecto da maior importância e delicadeza – a possível mobilização dos rendimentos da Fundação. Estes rendimentos são todos em dólares e são depositados nos Estados Unidos. A questão é para ser tratada com o maior melindre e discrição; mas compreende-se bem se esses rendimentos pudessem ser convertidos em libras, por exemplo, para serem gastos, por exemplo, em escudos, haveria uma cobertura preciosa que nos escaparia para ficarmos com outra que podíamos talvez dispensar. E não adianto mais neste ponto, mas ele interessa grandemente, ao que se vê, [a] Lord Radcliffe.” [“Carta de Oliveira Salazar para Pedro Theotónio Pereira”. 22 de Setembro de 1955. AOS/CO/PC – 44C, fls. 61-69 (pasta 1).]

1 Comments:

Blogger Cláudia [ACV] disse...

Gostei mesmo muito destes teus posts sobre Gulbenkian, Fernando.

7:05 da tarde  

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