De cima para baixo / De baixo para cima
"(...) uma espécie de megera masculinizada, horrenda e feroz, cujo único fim na vida é vociferar contra os homens e tentar tiranizá-los."
O que à maioria de então soava a vanguardismo perigoso, soa à de hoje a anacronismo desconfortável, como se na sociedade em que vivemos homem e mulher tivessem sempre sido iguais perante a lei. É bom lembrar que não, é bom dar a conhecer, entre outras que as precederam e sucederam, as pessoas acima referidas, que se o nosso país já não consagra dessas desigualdades de jure o mérito é delas. Já de facto, a realidade ainda é outra. Vamo-nos progressivamente aproximando do preceituado pelas instâncias supra-nacionais de que fazemos parte, não apenas no tocante à erradicação da discriminação negativa da mulher, como também à promoção da igualdade de oportunidades entre os sexos.
Não temos andado velozes, é certo, pelo que cheio de vontade de apressar o processo histórico aparece agora Bloco de Esquerda[BE], fazendo uma leitura extrema de um conceito já de si questionável na busca da equidade entre os géneros, o da discriminação positiva da mulher. Eis que se apresentam os projectos de lei nº221/X, nº222/X e nº223/X, visando alterar as leis eleitorais da Assembleia da República, das Autarquias Locais e do Parlamento Europeu, por via da introdução do cabalístico valor mínimo de 33,3% na representação por género em listas de candidatura. Deseja-se uma participação feminina expressiva nos órgãos cimeiros de decisão política? Na boa tradição legislativista portuguesa, decrete-se, diz o BE.
Será que não aprendemos a fazer a casa de baixo para cima? Num país em que a luta pela tal "paridade" a estão a construir todos os dias tantas mulheres, por via da iniciativa, da competência, do mérito, nas seus trabalhos e nas suas casas, a quem aproveita introduzir no acesso ao poder político, precisamente onde mais deve morar a excelência e o exemplo, um mecanismo que as apouca, menoriza e estigmatiza, e que é injusto para o homens?
13 Comments:
A legenda do conjunto de fotos está errada. Assim, no canto superior esquerdo, está George Sand, (1804-76), seguida por Ana de Castro Osório. Em baixo, à esquerda, Maria Veleda, e à direita Elina Guimarães. Assim sim, está correcto: o seu a sua dona!
Vou tratar de corrigir o erro.
António: de facto, estava (por desatenção minha) uma conhecida foto de G.Sand no lugar da de A.C.Osório, agora devidamente postada; a segunda foto pertence rigorosamente, ao contrário do que sugeriu, a Adelaide Cabete; quanto às duas seguintes, incorrecta estava como afirmou a sua ordem em relação à legenda, também já corrigida.
Fico-lhe agradecida pela chamada de atenção, cumprimentos blogosféricos,
ACV.
Não, não, tenha lá paciência! A senhora no topo, à direita, é Ana de Castro Osório - inconfundível! -e Adelaide Cabete não consta do rol. A primeira à esquerda, q entretanto introduziu, francamente não a reconheço. Quanto às outras: estão certas. Caso queira remeto-a para as fontes. Vale?
Cumprimentos,
António
António, estou bastante segura de que está equivocado:
acabei de consultar, para tirar dúvidas, outra fotografia de Adelaide de Jesus Damas Brazão Cabete, na p. 203 do "Dicionário de Educadores Portugueses", das Edições Asa, dirigido por António Nóvoa, que não me deixa dúvida de se tratar exactamente da mesma pessoa que está no canto superior direito da imagem acima postada, tirada da biografia histórica de Cabete, que está no site da Associação dos Professores de História, como pode confirmar acedendo pelo link da legenda.
Aliás, Ana de Castro Osório, no canto superior esquerdo retratada numa fotografia da juventude, colhida no site do Agrupamento de Escolas Ana de Castro Osório de Mangualde, terra natal da autora, que também consta do "Dicionário de Educadores Portugueses" numa outra fotografia em idade mais avançada (p.1019), é bem diferente de Cabete (atente nos olhos e no nariz). Caso ainda assim não se convença, observe a foto constante no seu passaporte de 1920, visível no Arquivo de Cultura Portuguesa Contemporânea da BN, em http://acpc.bn.pt/imagens/colecoes/n12_osorio_castro_familia.jpg,
; nenhuma delas se confunde com a de Adelaide Cabete.
Se tem outras fontes e/ou fotos que demonstrem que há no que digo qualquer erro, agradeço que as indique, por favor.
Obrigada,
ACV
Tem razão, mea culpa! É q as duas são fortes, robustas, prestam-se a confusão da qual me penitencio e lhe fiz perder tempo. A crédito restar-me-á a da G. Sand. Aliás nem lhe teria escrito se não fosse o tom do seu post em relação à paridade q, confesso, me causou alguma irritação e perplexidade. Por exemplo, quantas mulheres são directoras de jornais? Não há excelência suficiente de mulheres jornalistas para ocuparem tal cargo?
Cumprimentos,
António
António, tudo o.k., e repito o agradecimento pela chamada de atenção ao meu erro.
Quanto à discriminação positiva, apenas compreendo e concordo com a existência de quotas públicas na integração laboral de pessoas portadoras de deficiência.
Quanto à chegada de mulheres a posições directivas(e não conheço o mundo da imprensa o suficiente para avaliar o que pergunta), parece-me péssimo que se resolva o problema "à força". A introdução de quotas por género transporta a ideia de que mesmo com direitos, capacidades e habilitações semelhantes, as mulheres não conseguem lutar sem a intervenção directa do Estado pelo seu lugar na sociedade, não conseguem chegar onde querem pelo seu mérito e através das suas opções de vida (e aqui é que bate o ponto). Em meu entender, e numa sociedade ainda muito patriarcal como a nossa, estas quotas só obrigariam as mulheres a lidar (ainda mais que agora) com o estereótipo da menoridade e da mediocridade, com o "de outra forma não tinha chegado lá".
Cumprimentos, bom fim de semana,
ACV.
Ana Claúdia,
Compreendo o seu ponto de vista, contudo não concordo. Basta-me a constatação, simples, de quantas mulheres exercem cargos dirigentes ao nível das empresas, administração pública, o q quiser. Mesmo na universidade, onde são maioritárias a nível discente e andam meio por meio no docente, quantas são catedráticas, directoras de faculdade, reitoras? Suponho q já deve ter ouvido falar em glass ceiling...Diz q as quotas sublinhariam a traço grosso um estatuto de menoridade para as mulheres. Mas, diga cá com franqueza, não há quotas informais na constituição de listas para deputados, por exemplo? X para advogados, Y para médicos, Z para professores? Idem aspas aspas para as autarquias. E por aí fora. E nos países onde vigora o regime de quotas, sinceramente acha q as mulheres se apoucam num estatuto de subalternidade? Digo-lhe isto com sinceridade, boa-fé, e sem pertencer ao BE nem a qualquer outro partido. Simplesmente por pensar q, por vezes, na história, um “empurrão” ajuda muita.
Um bom fim-de-semana para si,
António
Ana,
Já que estamos numa onda de correcções, hoje o editorial de «O Público» atribui o «cabalístico número» ao PS.
Tenho as minhas dúvidas acerca da questão de quotas. Admito que elas façam sentido na Assembleia da República, já que se deve promover a diversidade de representação ideológica, profissional, regional e também de género no hemiciclo.
Um mistério para mim é que haja mais mulheres de direita proeminentes, não só na política mas também no jornalismo. Assim de repente, lembro-me de quatro nomes: Vera Lagoa e Helena Sanches Osório (jornais); Manuela Moura Guedes e Constança Cunha e Sá (televisão).
António: de facto, discordamos na completamente na questão do "empurrão", não há nada a fazer... Acrescentaria apenas que aquilo que chama "quotas informais" me parece de outra natureza, pela simples razão de não se tratar de uma obrigação legal, antes matéria de arbítrio e iniciativa dos partidos, gerida conforme os princípios e/ou a imagem que os mesmos desejam passar. Ou representar.
João: Ao PS? Não sei quem concebeu esse valor primeiro, eu enunciei-o porque consta do articulado dos três projectos do BE que refiro.E agora uma provocação: não achas que a representação de que falas soa a organicista, para não dizer...corporativa?
Boa provocação. Eu escrevi «promover» e não «impor», que foi a experiência que nós tivemos do corporativismo e lhe deu uma conotação pejorativa. A questão é saber se as regras informais existentes não desincentivam a participação das mulheres, apesar delas terem esse direito formal. Já não sei quem é que se referia, por exemplo, ao hábito dos deputados marcarem reuniões para o fim da tarde, a horas em que as mulheres, na sociedade real, vão buscar os filhos à escola e preparam o jantar. A perspectiva de «baixo para cima» é a seguinte: no dia em que houver partilha de tarefas domésticas, os homens também se baterão por outros horários. A perspectiva de «cima para baixo» é: no dia em que os homens forem obrigados pelas colegas mulheres a ter um horário diferente, não terão desculpas para não partilhar tarefas domésticas. Mesmo que preferisse a primeira hipótese tinha que admitir que a segunda dava resultados mais garantidos. É a tal questão de fins que justificam os meios.
Mais mulheres directoras de periódicos: Helena Matos (Atlântico) e Clara Ferreira Alves (Diário de Notícias).
Ana, parabéns pelo record na caixa de comentário do blogue. Está em minoria e és mais comentada. O mérito é todo teu ;)
Ana,
Pois é, não estamos de acordo, pois nesta matéria – como em tudo! - andamos ao arbítrio dos homens. E quanto mais para sul pior. Das desenvolvidas Suécia e Noruega, onde há quotas, note-se, aos países mediterrâneos, vai a distância de um mundo. E não creio q por lá as mulheres se sintam “menorizadas”. Menoridade, sim, é continuarem por cá a trabalhar, em média, mais 2h30 q os homens, em lides domésticas, crianças, idosos, sem possibilidade de atingirem postos de decisão política (no total da UE só 13% de mulheres). Aliás, mesmo q as condições de vida diária o consentissem, não creio q os homens abrissem mão do poder assim sem mais nem menos. Como é histórico e factual, ninguém o faz. E as mulheres q detêm lugares de poder utilizam exactissimamente a mesma lógica. Com uma agravante, a meu ver: é q as mulheres de estratos sociais mais altos, lá se vão governando com mulheres-a-dias ou até mesmo criadas internas, penalizando duplamente as de estratos sociais inferiores. Não vou citar nomes, por não valer a pena. Será q Fulana, Beltrana, e Sicrana, para puderem ser isto, aquilo e aqueloutro, no final do dia vão fazer o jantar, dar banho às crianças, arrumar a cozinha? Há excepções, eu sei: limitam-se a confirmar a regra. Daí o considerar, com toda a franqueza, a necessidade do tal “empurrão” q a tantos e tantas incomoda.
Cumprimentos,
António
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