terça-feira, julho 31, 2007

O fim de uma extraordinária aventura



O dia de ontem levou dois grandes realizadores: Ingmar Bergman (1918-2007) e Michelangelo Antonioni (1912-2007). Um génio nórdico e um génio latino que fizeram da sétima arte uma forma de prestar culto às mulheres, de reflectir as crises de identidade do homem moderno, e de sondar o silêncio de Deus. Um dos filmes de Antonioni - The Passenger (1975) - esteve em reposição em Lisboa no Verão passado e sobre ele escrevi aqui.

Etiquetas: ,

Antonioni (1912-2007)

O que fica do que passa

Ontem morreu Ingmar Bergman (1918-2007). Assisti apenas à estreia do último dos seus filmes, Saraband, sobre o qual escrevi aqui e aqui. Vi a maior parte dos seus outros filmes em peregrinações solitárias à Cinemateca, como adolescente e jovem adulto. Pertenço a uma geração intermédia, entre as dos anos 60 e 70, que discutiu Bergman nos cineclubes e após as estreias comerciais, e as gerações do século XXI que o descobrirão em DVD. Para algumas pessoas Ingmar Bergman terá sido moda e autor de referência. O meu professor de jornalismo no 10.º e 11.º anos, avesso a todas as espécies de moda, não deixava de sublinhar as afinidades entre algumas obras do grande autor e algumas telenovelas. Ou de denunciar o snobismo pseudo-intelectual de algumas pessoas que se sentiam na obrigação de ver e de dizer que tinham visto Bergman. Era de outro mundo que nos falava. Um mundo que a minha geração nunca conheceria em que a cultura era vista mais como uma variação do sagrado do que uma opção de consumo; uma via para obter status mais prestigiada do que a do dinheiro; um assunto mais sério do que a escolha do lugar onde passar férias. Para mim, Bergman era contra-cultura pura e dura, no contexto da geração yuppie que era o meu. Era também já o que continua a ser e será, um expoente do cinema e da arte.
Muitos dos blockbusters dos anos 80 e 90 já estão esquecidos. Mas Bergman hoje enche as primeiras páginas dos jornais de todo o mundo e continuará, enquanto houver espécie humana, presente nos museus de Cinema, nas colecções privadas de DVD´s ou em qualquer outro suporte por inventar. Aquilo que aproximava o grande cineasta da arte menor da televisão - os ambientes intimistas e familiares, os grandes planos dos rostos - poderá ser um dos seus trunfos numa era em que o cinema aposta no espectáculo fácil, ou se enreda na auto-citação, ao mesmo tempo que algumas séries televisivas apostam na qualidade dos guiões, tornando-se objecto de culto de um público exigente. Bergman ficará porque conseguiu revelar o essencial da condição humana usando a matéria-prima mais frágil: o rosto.

Etiquetas: ,

Para Bergman

sábado, julho 28, 2007

Sugestão à NASA




Fazer uma campanha dirigida astronautas com o slogan «Se andar de foguetão não beba». Ver a pertinência da campanha aqui.

Etiquetas: ,

O 'Escutismo' e os 'Escuteiros'


Ai existem, existem, caro João. E se estão nos nossos dicionários, foi porque delas houve necessidade e porque o uso as consagrou. É que a nossa língua exprimiu bem a multiplicidade de fenómenos que em Portugal, entre 1911 e a actualidade, derivaram (mais ou menos ortodoxamente) do boy-scouting concebido por Robert Baden-Powell - pela primeira vez posto em prática numa pequena ilha da Baía de Poole, fará no próximo dia 1 de Agosto cem redondos anos -, mas também forjou palavras para falar da coisa em termos gerais. Ressuscitaste no teu post uma velha polémica nominalista que, em meu entender, não tem qualquer validade. Porquê? Porque em Portugal tivemos (e em alguns casos temos) escoteiros, adueiros, escutas, desbravadores e royal rangers, dos quais derivaram outros tantos "ismos", correspondentes a outras tantas agremiações, mas nenhuma destas serve para descrever os indivíduos e a experiência pedagógica nacionais na sua globalidade. Vejamos: nas primeiras actividades do género, ocorridas em 1911, utilizaram-se as expressões originais (boy scout e scouting); porém, alguns membros da futura Associação de Escoteiros de Portugal, oficializada em 1913, promoveram de Agosto a Outubro de 1912, n'O Século, uma consulta pública para a adaptação da terminologia à nossa língua. Como em português já existia o substantivo/adjectivo escoteiro, que tinha algumas semelhanças fonéticas e de significado, essa foi a palavra escolhida. Situação e processos similares, aliados à necessidade de distinção, levaram à escolha das palavras adueiro (1914), escuta (1934) e desbravador (1975). Ora, apenas no seio de cada "capelinha" uma terminologia restrita fazia e faz sentido. O querer falar genericamente do boy scout português, e em bom português, levou (em meados do séc. XX) ao aparecimento do termo 'escuteiro' (e, por derivação, 'escutismo'), curiosa fusão entre as denominações (escoteiro + escuta) criadas pelas duas associações portuguesas mais duradouras, a Associação de Escoteiros de Portugal, a que tu pertenceste, e pelo Corpo Nacional de Escutas, a que eu pertenci. E assim é, até hoje, muito justificadamente.

Um grande left hand shake para ti.

sexta-feira, julho 27, 2007

D. H. Lawrence



«Connie dirigiu-se lentamente para Wragby. Para "casa"! Casa era uma palavra calorosa para aquela enorme barraca triste. Outrora tivera significado, mas perdera-se. Todas as palavras grandiosas tinham perdido o significado para a geração de Connie: amor, alegria, felicidade, casa, mãe, pai, marido – numa agonia prolongada. A casa era o lugar onde se vivia, o amor uma coisa sobre que não havia ilusões, alegria a palavra que se aplicava a um bom charleston, felicidade o termo hipócrita para enganar os outros, o pai um indivíduo que gostava da vida, o marido aquele com quem se vivia e compartilhava o bom humor. O sexo, a última das palavras grandiosas, não passava de um termo de cocktail para traduzir uma excitação que animava por uns escassos momentos, mas que depois deixava a pessoa mais desprotegida do que nunca. Um desgaste como se as pessoas fossem feitas de matéria de má qualidade que se ia desfazendo até ficar em nada.
Tudo o que realmente subsistiu foi um estoicismo obstinado, de que era possível extrair prazer. A própria experiência do vazio da vida, fase por fase, etapa por etapa, trazia uma forma tristonha de satisfação. É assim! – era sempre a última palavra: casa, amor, casamento, Michaelis: é assim! E à hora da morte as últimas palavras seriam: é assim!
E o dinheiro? Com o dinheiro não se pode dizer o mesmo, as pessoas sempre quiseram o dinheiro. O dinheiro, o êxito, a deusa-cadela – como Tommy Dukes dizia sempre parafraseando Henry James -, eram uma necessidade permanente. Não se pode gastar o último tostão e depois dizer: é assim! Não, porque é preciso dinheiro para isto ou para aquilo, mesmo que seja para mais dez minutos de vida. Num desenrolar mecânico, para tudo é preciso dinheiro. É preciso tê-lo, tem de se ter dinheiro. Nada mais interessa. É assim

D. H. Lawrence, O Amante de Lady Chaterley, Porto, Publicações Europa-América, 2002, pág. 72

Etiquetas: , ,

quinta-feira, julho 26, 2007

Transformar o modo de agir

Em 1992, no Rio de Janeiro, representantes de quase todos os países do mundo reuniram-se para decidir que medidas tomar para conseguir diminuir a degradação ambiental e preservar a existência de outras gerações.
A intenção, nesse encontro mais conhecido como a Cimeira da Terra, era introduzir a ideia do desenvolvimento sustentável, um modelo de crescimento económico menos consumista e mais adequado ao equilíbrio ecológico, ou seja, procurar os meios que permitissem conciliar o desenvolvimento social e económico com a conservação e protecção dos ecossistemas da Terra.

O amante de Lady Chatterley



Num mês de filmes fraquinhos em cartaz, O Amante de Lady Chatterley, de Pascale Ferran, destaca-se. É dos melhores filmes que se podem ver neste momento em Lisboa, embora não mereça o pedestal em que o colocou a crítica, embalada pelos prémios atribuídos à película em França. A actriz Marina Hands é razão mais do que suficiente para ver o filme. Apesar do seu charme muito francês destoar na personagem muito britânica de Connie. Mas essa é uma crítica que se podia estender à obra no seu todo. É esquisito ouvir personagens inglesas, num ambiente muito inglês, a falar francês. Alguém consegue imaginar o que seria uma adaptação do mesmo género em português, com ladies e um sir a falar com pronúncia do Porto? O que agradou muito aos críticos foi a realizadora ter enveredado por uma via especificamente cinematográfica na adaptação de um romance. Ela dá-nos o que um texto não nos pode dar: a visão dos corpos, dos rostos, dos gestos que preenchem pausas, silêncios. No final, fica-nos a impressão de que o filme é longo demais para a história que conta.
Depois de ver o filme li o romance e a versão de Pascale Ferran desceu alguns pontos na minha escala. É claro que o livro possui uma envergadura que obriga uma transposição cinematográfica a fazer selecções. D.H. Lawrence critica toda uma geração pós-I Grande Guerra, a sociedade industrial, os costumes, a mentalidade e a cultura dominante. A obra tem um fôlego ao nível de alguns títulos de grossas lombadas de Thomas Mann. Ferran optou por concentrar-se na história de amor, na construção de intimidade num casal, mas fê-lo de forma redutora.
A própria caracterização física de Oliver Mellors contrasta com a do actor escolhido por Pascale Ferran: o couteiro é um homem magro, de mãos pequenas. Ao contrário do que sugere o filme, ele não passou directamente de uma família de mineiros para o trabalho de couteiro. Foi um excelente aluno de liceu. Durante a Grande Guerra serviu na Índia como oficial, no posto de tenente e privando com um coronel. Teve oportunidades de «subir na vida», mas não as quis aproveitar. Prefere é o trabalho solitário de couteiro a um trabalho com exigências sociais mais pesadas. Connie teve um namorado antes do marido, Clifford, e um amante antes de Oliver. Clifford não é apenas um proprietário e dono de minas, mas também um literato, admirador de Proust, com obra publicada e, dentro de certos limites, reconhecida. A senhora Bolton, que cuida de Clifford, mantém com este uma complexa relação de amor-ódio e torna-se cúmplice de Connie. Os exemplos de simplificação da complexidade das personagens e das relações que estabelecem entre si podiam multiplicar-se.
O filme francês parece glosar uma variante do mito da «Bela e o Monstro» que é «a bela delicada e o homem bruto de bons sentimentos». A nota crítica que hoje sai no Público ecoa este ponto de vista ao ver na narrativa «uma domesticação difícil».
D. H. Lawrence ter-se-ia arrepiado com a visão do seu Oliver Mellors como homem em vias de domesticação. Pelo contrário, a força da personagem está na sua resistência à domesticação. Ele recusa a negação do corpo e da natureza sexual de cada um pela «espiritualidade» e «racionalidade» dominantes. Não para, à maneira de alguns surrealistas, proclamar que nos instintos se encontra a única verdade e o único valor, mas para afirmar, juntamente com o valor do corpo e do sexo, uma outra espiritualidade e uma outra racionalidade.

Etiquetas: , ,

quarta-feira, julho 25, 2007

A Bela Calada

O último filme de Manoel Oliveira retoma algumas personagens de «Belle de Jour» de Buñuel e pretende homenagear o realizador espanhol. O resultado é um filme palavroso, sem que o francês de Oliveira tenha o mesmo vigor do português de Agustina. As melhores sequências são alguns raros momentos em que as personagens não falam, apenas agem. Quase a completar cem anos de idade, Oliveira já domina a técnica do cinema mudo. Dêem-lhe mais cinquenta anos e torna-se um mestre do cinema sonoro.

Etiquetas: , ,

terça-feira, julho 24, 2007

Almanaque do Povo



Novidades: Atenção, atenção, aos mais distraídos como eu; abriu a Barbearia do (meritoriamente afamado) Senhor Luís, mudou de direcção o Lóbi do Chá.

Muitos anos de vida: ao Solsvtäg, que comemora dois-anos-dois, pela mão do esteticamente irrepreensível Hugo.

Passei e gostei: pelo blogue O Estado do Mundo, da Gulbenkian, sim senhora.

Se eu fosse grande queria escrever uma série como: a do Ricardo. Nem sei que diga (de tão bem) a propósito dos 'Discos da Vida Ao Sabor da Falta de Assunto'.

[Tiras: Superaventuras Marvel, Nº 22. Desenhos de John Byrne; Argumento de Chris Claremont.]

Etiquetas:

segunda-feira, julho 23, 2007

Simplesmente "postar" de um modo desalinhado

Existe em mim uma arraigada necessidade de imprimir sinais na realidade, um enraizado anelo por deixar marcas, traços das minhas expectativas, de exteriorizar um eu que experimenta com perplexidade o mundo acontecendo, ecoando em mim.
A voz impessoal desta orgânica que acaba por me transcender "fala-me" enigmaticamente, deixa-me mensagens e pistas da minha (quiçá) inatingível complexidade. Observando estas múltiplas manifestações, aventuro-me nas sensações, nas emoções, nos sentimentos que me suscitam e, intimamente envolvido, esforço-me, à minha escala, por compreender.
Com a consciência de uma espécie de apelo, talvez de uma pertinência interpeladora, registo, suspendo em formas essa ânsia de entender. A escrita e mesmo a linguagem são instrumentos da minha curiosidade e perscrutação. Ao postar sobre um assunto exponho num texto aquilo que conheço e, por conseguinte, nos silêncios, nas intermitências, na inefabilidade, nas lacunas, transparece aquilo que ignoro. Mas é precisamente essa insuficiência que me empurra irresistivelmente para o abismo daquilo que me fascina, para o âmago do que me sobressalta ou ofusca. Continuarei na forma de registo a fazer perdurar reflexões e conjecturas aqui mas gostava de nesta dinâmica colectiva para a qual fui convidado simplesmente postar desalinhadamente.

Zahir Shah (1914-2007), rei do Afeganistão


Faleceu Mohammad Zahir Shah, rei do Afeganistão, deposto em 1973. Durante as quatro décadas em que reinou, assegurou a paz e a prosperidade relativas que o Afeganistão não voltou a ter, massacrado por guerras civis, a invasão soviética e o radicalismo islâmico. Desde 2001, os novos senhores do País proclamaram-no "pai da pátria", uma figura de estilo inconsequente que não deu ao Afeganistão a chefia de Estado suprapartidária e moderadora de que o país precisava. O seu neto e sucessor legítimo, Mustafa Zahir, já prometeu continuar o exemplo do monarca falecido. Ver aqui.

D. Juan de Bourbon, conde de Barcelona

Agora que está a tornar-se moda atacar a monarquia espanhola e o rei D. Juan Carlos I, há que lembrar a figura de seu pai. Ao contrário do que querem os sectários republicanos, a legitimidade de D. Juan Carlos I não lhe vem de Franco o ter nomeado sucessor nem sequer do juramento que o rei fez ainda dentro do regime franquista para se tornar chefe do Estado espanhol (ver aqui); foi a abdicação formal de D. Juan de Bourbon, conde de Barcelona, seu pai - numa cerimónia que se vê logo no início deste vídeo (e que teve lugar em 1977) - que o consagrou rei legítimo de Espanha. A entrada em vigor da Constituição de 1978, plebiscitada pelo povo espanhol, confirmou a monarquia constitucional e parlamentar e a dinastia reinante. Esta é a verdadeira base de legitimidade da Casa Real espanhola. Tudo o resto é incitamento ao ódio e à demagogia (mistura em que os anti-monárquicos são especialistas).



P.S. Dito isto, é para mim evidente que deve ser repudiado o acto de censura (mesmo que emanado de uma autoridade judicial) de que foi recentemente alvo a revista "Es Jueves"; este tipo de medidas "preventivas" são um mau precedente e estão longe de "defender" a Casa Real.

A minha utopia geo-político-cultural



Tal como Saramago, eu também tenho uma utopia geo-político-cultural. Primeiro passo: dar a independência à Madeira. Melhor: negociar com Espanha e trocar a Madeira pelas Canárias. Depois formar a Federação Hispânico-Atlântica. Os portugueses do continente integrariam a FHA, juntamente com a Galiza, os Açores, as Canárias e Cabo Verde. Os espanhóis tinham de resolver o problema do país basco, suportar a Madeira e aturar Saramago. Alguém duvida de que ficávamos a ganhar?

Etiquetas: , ,

Saramago e Salazar na Jangada de Pedra

Uma das ironias que passou despercebida no devaneio de Saramago da Jangada de Pedra, é que ela reproduziu à esquerda, quarenta anos depois, um sonho de Salazar. Após a queda dos fascismo durante a II Grande Guerra, o ditador português tentou construir uma aliança diplomática entre as ditaduras ibéricas e o Estado Novo de Getúlio Vargas que resistisse aos ventos de democratização no mundo latino. Pedro Teotónio Pereira foi colocado como Embaixador no Brasil com essa esperança. Teve azar. No início de 1946 Eurico Gaspar Dutra tomou posse como Presidente da República eleito, sucedendo ao ditador Getúlio Vargas. Em 15 de Janeiro desse ano, Pedro Teotónio Pereira tentava consolar-se escrevendo a Salazar: «Algumas pessoas sensatas com quem tenho falado, são da opinião que o General Dutra usará de medidas violentas para restituir um pouco de serenidade e disciplina a este meio em ebulição. Parece que a febre actual vem mais pronunciadamente dos últimos meses de Verão e que foram os fumos democráticos que deram com esta gente em doida.»

Etiquetas: , ,

Espanha não é aqui

A defesa por Saramago da fusão de Portugal e de Espanha numa «Ibéria» causou visível irritação patriota. A publicação, há mais de vinte anos, da Jangada de Pedra parece que foi recebida sem grande polémica. Saramago ainda não era Nobel, ainda não tinha deslocalizado a produção literária para Lanzarote. Era apenas um entre muitos outros escritores, distinguindo-se por Memorial do Convento e O Ano da Morte de Ricardo Reis terem saído há poucos anos e ser um autor em fase ascendente. Mas outra razão pesava para que Jangada de Pedra fosse recebida com benevolência. Uma década após o fim do PREC e um ano depois da assinatura do tratado de adesão de Portugal à CEE, o romance era o esboço de uma utopia geopolítica em alternativa ao capitalismo que nos chegaria inevitavelmente da Europa. A Península Ibérica descolava-se dos Pirinéus e lançava-se ao Atlântico, rumo a uma América Latina onde ainda era o socialismo revolucionário ainda parecia possível.
Hoje um Portugal província de Espanha seria apenas menos Portugal, igual Europa, igual ou mais burocracia, talvez ainda menos utopia, certamente mais «Hola». Em vez de um Presidente da República teríamos uma monarquia ibérica. A discussão do relacionamento entre Lisboa e Madrid centrar-se-iam nas inclinações sentimentais que poderiam unir os filhos de Filipe e Letizia aos filhos de D. Duarte e D. Isabel Herédia. Uma consequência prática destas especulações seriam os nossos candidatos a Rei deixarem cair o «D.» para os seus nomes ficarem melhor nas capas da «Hola», criando uma imagem mais leve, mais informal, enfim, de agrado peninsular.

Etiquetas: ,

sexta-feira, julho 20, 2007

Ron Paul: "Only freedom is really compassionate"

Uma hora com o melhor candidato presidencial norte-americano: o republicano libertário Ron Paul (médico e membro da Câmara dos Representantes pelo Texas). O senhor Paul é "o" fenómeno político depois de Margaret Thatcher. Este candidato tem ainda um alto valor pedagógico para todos os liberais: é consequente na forma como defende o valor da liberdade individual, sem se enredar nas armadilhas da dicotomia esquerda/direita, rebate com os mesmos argumentos o "welfare" e o "warfare". No senhor Paul é como se visse Alexandre Herculano a candidatar-se à presidência dos E.U.A. É, como ele diz, o candidato constitucionalista.

Via A Arte da Fuga. (Actualizado)

Saúde Estrelada

A criação e aplicação de um sistema de avaliação de cuidados de saúde em Portugal será um esforço inquestionavelmente relevante por parte da Entidade Reguladora da Saúde. Mas que dizer de uma anunciada simplificação em estrelas? Talvez que, do ponto de vista desta utente, não soa a grande coisa. Primeiro - e passando por cima do desagrado que instintivamente provoca a comparação entre unidades inevitavelmente associadas ao lazer a unidades inevitavelmente associadas ao sofrimento - porque ao transmitir tal informação aos cidadãos se comunicam valores sobre os quais estes não poderão propriamente exercer livre escolha (pelo menos no domínio público, no qual se insta todo o utente a não se dirigir a um hospital por qualquer razão, mas onde, por outro lado, o acesso às unidades básicas do SNS é limitado por inscrição a uma única, a da zona de residência), o que só os frustra. Depois, porque se invoca esse clássico legitimador, o precedente estrangeiro, sob a forma de um "à semelhança do que já existe no Reino Unido e nos Estados Unidos", que nada esclarece: afinal, irá ser o nosso sistema de avaliação mais semelhante ao dos rankings publicados por empresas certificadoras cotadas em NASDAQ, ou ao das fundações sem fins lucrativos? Ou será que é para acontecer o que aconteceu no Reino Unido, onde o star rating [público, já que a entidade avaliadora não considerou ter capacidade para avaliar TODAS as unidades do país] da saúde durou pouco e, por insatisfatório, foi já abandonado?

Etiquetas:

quinta-feira, julho 19, 2007

Reforços para a nova época

O Amigo do Povo encontra-se em processo de mobilização de novos (e não tão novos) bloggers. O David Soares, servindo a solo até à data, juntar-se-á à nossa companhia por estes dias. Sejas bem aparecido, caro David.

quarta-feira, julho 18, 2007

Provas de agregação

O professor Luís Salgado de Matos vai, amanhã e depois de amanhã, prestar provas de agregação para o Grupo de Ciência Política e Relações Internacionais. As provas serão realizadas na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, às 16 horas, Auditório 1, Piso 1, Edifício B.

Etiquetas: ,

Fecha-se uma porta,

abre-se uma janela. Depois de uma sexta-feira treze a fazer pouco da superstição dos outros, um sábado catorze de terror tecnológico: lcd [de pc-portátil-filho-único] fatal e misteriosamente colapsado em momento laboral intenso e decisivo. Domingo de back-ups e ranger de dentes. Depósito para arranjo à segunda-feira, previsão de devolução em cinco dias úteis. Quarenta e oito horas depois, contacto para levantamento. Portátil como novo. Alívio. Gaúdio. Quasi-Histeria.

Isso mesmo, caro leitor: neste país há quem trabalhe e deixe trabalhar.


Etiquetas:

segunda-feira, julho 16, 2007

No rescaldo das eleições

As eleições para a câmara municipal de Lisboa são, em termos ideológicos, uma vitória da esquerda e uma derrota da direita e, em termos pessoais, uma vitória de António Costa e de Helena Roseta. Sinalizam também uma grave crise da democracia representativa.
Destes aspectos, o menos focado tem sido o da vitória pessoal de António Costa. Inclusivé pelo próprio, que se limitou a sublinhar que é a primeira vez em 31 anos que o PS ganha sozinho umas eleições municipais em Lisboa e que essa vitória se deu em todas as freguesias. Convém lembrar que é também uma das raras vezes, se não a primeira, que António Costa ganha uma eleições. No início da década de 90 disputou as eleições da Câmara Municipal de Loures e perdeu. Mesmo no interior do PS não creio que tenha ganho muitos sufrágios eleitorais. A sua imagem de credibilidade política foi construída como ministro. Daí não ser tão líquido assim tratar-se de uma «aposta forte» do PS na Câmara Municipal de Lisboa. Rui Ramos atacou precisamente este ponto em artigo de opinião no Público. Seria uma peculiaridade de Portugal e um sinal de debilidade política, que um candidato sem eleições ganhas no seu curriculum fosse considerado «forte». O mérito de António Costa não tem sido enfatizado nas análises. Soube atrair à sua candidatura personalidades relevantes da vida pública que não são do PS: Saldanha Sanches, José Miguel Júdice, etc. Soube reconciliar parte do PS irritado com Sócrates com uma candidatura apoiada por este partido. António Costa é um «animal político» que finalmente encontra o seu habitat natural: um lugar cimeiro conquistado em eleições. Eu sou dos que dá valor ao discurso de Helena Roseta sobre o «espírito cívico». Mas não secundarizo o «espírito político» face ao «cívico». O político não se limita a defender intransigentemente valores – negoceia posições e estabelece compromissos. É esta prática assumida que o liberta de tiques tecnocráticos e autoritários.
Quanto à derrota da direita, Manuel Monteiro tem sido outro aspecto esquecido. É pena. Achei a sua campanha eleitoral patética, ao nível da merda dos cavalos da GNR, sobre a qual gastou generosamente tempo de audiência nos telejornais. Mais uma vez, é instrutivo lembrar que, no final do século passado, Manuel Monteiro foi considerado pelo Expresso «personalidade política do ano». Como veremos o início da liderança do CDS/PP por Manuel Monteiro daqui a uns anos? Monteiro a marioneta de Portas ou Monteiro o precursor de Portas?
A distância temporal talvez nos permita também olhar para este período da liderança da Câmara Municipal de Lisboa por António Costa como um «laboratório» do que será a política nos próximos anos a nível nacional. Se o PS não voltar a ganhar a maioria absoluta, o que teremos? O regresso do bloco central? Uma coligação com a CDU ou o bloco? O caos gerado por desentendimentos permanentes entre todas as forças políticas de esquerda? Comecei por escrever que a esquerda venceu, mas teremos de esperar para saber se não se tratou de uma vitória de Pirro.

Etiquetas: , , , , ,

sábado, julho 14, 2007

A salvífica onda


Como se sugere aqui, as desgraças não olham a rótulos para entrarem neste mundo. O que se está a passar é muito sério porque vai mexer com os nossos bolsos de uma forma de que a geração actual já não tem memória. Eu não sou bruxo, mas que há dois anos já me parecia que o potencial da ideia estava para encarnar nalgum maluco, lá isso parecia-me...

Junte-se esta outra questão de vida ou morte ("Segurança Social: o pesadelo", sobre estudo noticiado no "Público" de 17 Julho) e, apesar da propaganda e de estarem todos a dormir, fica-se a perceber que estamos metidos num rico beco sem saída.

(Actualizado)

quarta-feira, julho 11, 2007

Liberaizitos e liberaizecos


Quem serão estes liberaizitos? Já os liberaizecos continuam a demonstrar militantemente a sua falta de cultura histórica, insuficiente para distinguirem entre D. João VI e D. Miguel; é por isso que depois confundem, com o mesmo à-vontade, liberalismo e jacobinismo... Conviria, de qualquer forma, que não reclamassem datas que, evidentemente, não lhes pertencem (os bravos do Mindelo bateram-se pela Carta e por D. Maria II, não por Afonso Costa nem pela lei de "separação").

P.S. E agora, para tirar o sono ao higienismo liberaizeco: Robespierre tomaria banho? Grave questão, esta...!

segunda-feira, julho 09, 2007

Neste fim de semana o Almanaque do Povo não saiu

, ou melhor, saiu, mais precisamente em direcção a Tomar, a ver das famosas festividades em honra do Espírito Santo. Ainda passou por Vila Franca de Xira, mas em hora matutina toiro e lidadores de ocasião apresentavam-se bastante ensonados. A festa nabantina impressiona. Pelo esforço dos processionários, pela sazonal amenidade do rio, pelo brio dos anfitriões. Também pela concentração de visitantes. Sotaque vário, farnéis aviados, lugares guardados horas e horas, fatiotas domingueiras, catitas e totalmente desadequadas ao esforço de longas caminhadas e esperas ao sol, como é apanágio nacional. Gente mais velha, mais saudosa de antigas tradições, e gente mais nova, desligada do ritual, simplesmente curiosa. No final o Almanaque tinha café marcado com amigos de cinco nacionalidades; fizeram balanço positivo, mas manifestaram pena unânime por não ser visitável o Convento de Cristo, em tarde e noite de excepção como esta. Aqui fica a sugestão para 2011.

sexta-feira, julho 06, 2007

Em 2010, comemorar o pioneirismo do 5 de Outubro!


A páginas 172 do seu livro THE DICTATORS (Penguin, 2005), o historiador Richard Overy diz o seguinte:

«The “one-party” system was a novelty in inter-war Europe. No European state before 1914 had been dominated and led by a single political party.»

Ora, sabemos que a história portuguesa, mercê da natureza periférica do nosso país, é pouco tida em conta quando as generalizações da historiografia pretendem abarcar todo o "velho continente". É isso que explica que Overy não reconheça à I República em Portugal a coroa de glória que lhe cabe de ter inaugurado na Europa a experiência do governo de partido único. De facto, este regime pioneiro, depois de se assenhorear do poder por meios violentos (1910), liquidou (em sentido figurado, calma...!) toda a classe política anterior, exerceu um período de ditadura só com membros do partido republicano e fez eleger uma assembleia constituinte só com republicanos (1911), garantindo um monopólio funcional do sistema político nos anos seguintes, apesar da divisão em três e mais forças políticas do mesmo partido republicano (o que faz alguns achar, incompreensivelmente, que a vida política e parlamentar da I República foi um caso de pluralismo político). Look again...

Na verdade, o Estado Novo (i.e., a II República) não precisava de inspirar-se no fascismo para chegar à solução do monopólio da União Nacional. O paradigma, pioneiro na Europa, já existia em Portugal desde 1910. O que os republicanos da II República fizeram foi melhorá-lo um pouco: já que era para haver governo de partido único, então que se poupasse o País a ser governado pela guerra civil interna do partido republicano a que nos habituámos a chamar "história política da I República".

Para os intervenientes nos festejos públicos (já em preparação) do centenário dessa data inesquecível que foi o 5 de Outubro de 1910, aqui fica a lembrança e a sugestão: não esquecer de vincar bem o carácter pioneiro da I República Portuguesa. Não esquecer que em 5 de Outubro de 1910, Portugal deu à Europa a fresca e progressiva inovação política do SISTEMA DE PARTIDO ÚNICO!

quinta-feira, julho 05, 2007

Exposição

É visitável até ao próximo dia 14 de Setembro, na Bibilioteca Nacional, uma mostra documental dedicada ao Professor António Oliveira Marques. Apesar de ser há vários anos leitora da biblioteca, só agora - perante a riqueza de um espólio feito de manuscritos, condecorações, brinquedos, insígnias, cadernos de escola e outra memorabilia - me apercebi de quão confrangedoras são as vitrinas que debruam uma das paredes da Sala e Referências, de tão desadequadas ao seu fim. Sendo que existem em outro piso dois espaços destinados a exposições, presumo que esta e as mais mostras aí realizadas o sejam pela proximidade com o público, que quase obrigatoriamente passa por esse espaço. Contudo, para uma biblioteca da dimensão desta, e numa sala de digníssimo pé direito e área franca, é motivo de verdadeiro embaraço uma fileira de expositores acanhados e de cor parda, onde tudo o que nos é dado a observar se confunde, se perde. Para quando, a pouco complicada alteração desta situação?

[foto]

Etiquetas:

domingo, julho 01, 2007

Almanaque do Povo

Parabéns: ao Adufe, por quase trinta anos de blogosfera, e ao Memória Virtual, por outros tantos.

O Bombo e a Festa: Quando há uns anos se inaugurava um acontecimento ao ar livre, arranjavam-se uns pára-quedistas que depois aterravam no sítio (mais ou menos) marcado envoltos por uns fumos coloridos. Em opção, punham-se em cena acrobatas, fazia-se desfilar a fanfarra do distrito. Hoje têm mesmo de ser sempre mas sempre mas sempre os Tocá Rufar?

Blogues que não conhecia, passei a conhecer, e gostei: Há Mouro na Costa, de António Dias , Doc Log, de Leonor Areal, e Ainda Não Começámos a Pensar, de André Dias.

Chinoiserie: Sabiam que chá vermelho é exactamente a mesma coisa que chá preto? Eu soube hoje: chá vermelho é a designação comum dada pelos orientais às folhas de camellia sinensis que passaram por um o processo completo de oxidação (ao contrário do branco, que não oxida de todo; do verde, que apenas é seco a vapor; do oolong, que é semi-oxidado; e do pu-erh, que é fermentado).

Etiquetas: